sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Sintomas de uma ciência doente

SOURCE: THOMSON REUTERS JOURNAL CITATION REPORTS
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Quatro periódicos brasileiros foram punidos por burlar o sistema de citações para aumentar seu fator de impacto (FI).
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Foi publicada hoje (29.08), na revista Nature, uma matéria que revela um esquema de citações usado por revistas acadêmicas brasileiras para aumentar seu fator de impacto (FI): medida que reflete o número médio de citações de artigos científicos publicados em determinado periódico.
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A auto citação, que compreende a citação de trabalhos da mesma revista em que o artigo será publicada, já é uma prática dita antiga e vem sido rastreada e punida pela Thomson Reuters. No entanto, revistas brasileiras tentaram burlar o sistema com o famoso jeitinho brasileiro. Quatro revistas, dentre elas a Clinics, fizeram uma combinação para que uma revista citasse artigos da outras revistas do esquema. Os editores acreditaram que o sistema não detectaria este movimento, no entanto, foram pegos em flagrante. Como punição, estas quatro revistas brasileiras terão seu FI suspenso por um ano.
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Maurício Rocha-e-Silva, ex-editor de uma das revistas punidas (despedido após descoberta da fraude), disse à revista Nature que o plano nasceu de uma frustração criada pela fixação brasileira por FI. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) avalia cursos de pós-graduação com base nos fatores de impacto em que os estudantes publicam. Como a maioria das revistas brasileiras emergentes apresentam fator de impacto muito baixo, os estudantes buscam publicar nas que tem maior impacto e isso alimenta um ciclo vicioso. A CAPES afirmou que não levará em conta os artigos publicados pelas revistas punidas no período de 2010-12 na avaliação dos cursos de pós-graduação CAPES 2013. Além das revistas, cursos de pós-graduação serão punidos com esta medida e possivelmente terão sua avaliação prejudicada e receberão menos recursos da CAPES.
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A tentativa de burlar o sistema demonstra uma ciência doente, regida por uma rígida avaliação que leva em conta o número de publicações e o FI das revistas em que os pesquisadores publicam. Toda esta cobrança faz com que pesquisadores de todo o país entrem numa corrida por publicar um artigo atrás do outro e são forçados a “esquecer” que existe vida fora dos laboratórios, universidades e centros de pesquisa. Palestras, textos em linguagens simplificadas e utilização de outros meios para divulgar a pesquisa para um público não especialista é um hábito praticamente em extinção na comunidade científica brasileira.
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Montemos um modelo básico de como funciona a pesquisa: A CAPES injeta dinheiro público nos cursos de pós-graduação. Os cursos de pós-graduação publicam cada vez mais artigos e em revistas de FI cada vez mais elevados. Com isso os cursos são melhores avaliados pela CAPES e recebem mais recursos para mais pesquisas e mais publicações. Parece lógico que esta engrenagem funcione, no entanto, funciona graças a recursos públicos utilizados. Então, de certo modo, a sociedade financia parte da pesquisa feita em nosso país. Segue a pergunta que os pesquisadores não gostam de ouvir: A sociedade sabe o que o pesquisador faz dentro do laboratório? Em outras palavras: A sociedade sabe como está sendo investido (ou gasto) o recurso público usado para financiar pesquisas? Todo este sistema de cobrança e avaliação desencoraja os pesquisadores a comunicarem sua pesquisa para a comunidade não acadêmica de forma compreensível. Em analogia, a ciência e sociedade brasileira encontram-se em placas tectônicas distintas e em constante afastamento.
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“As Universidades Públicas são instituições de ensino com um importante papel social: gerar e difundir conhecimento. Isto significa dizer que as universidades públicas podem e devem contribuir para o desenvolvimento da sociedade através das pesquisas que desenvolve e dos alunos que forma, esta é sua função, é com esse objetivo que ela é mantida.” guiadedireitos.org/
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