quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Pesquisador afirma que estrutura das escolas adoece professores

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“O ambiente Escolar me dá fobia, taquicardia, ânsia de vômito. Até os enfeites das paredes me dão nervoso. E eu era a pessoa que mais gostava de enfeitar a Escola. Cheguei a um ponto que não conseguia ajudar nem a minha filha ou ficar sozinha com ela. Eu não conseguia me sentir responsável por nenhuma criança. E eu sempre tive muita paciência, mas me esgotei.”
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Sem infraestrutura: Em 72,5% das Escolas da rede pública não há biblioteca
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 Estrutura Escolar adoece Professores e leva a abandono da profissão
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O relato é da Professora Luciana Damasceno Gonçalves, de 39 anos. Pedagoga, especialista em psicopedagogia há 15 anos, Luciana é um exemplo entre milhares de Professores que, todos os dias e há anos, se afastam das salas de aula e desistem da profissão por terem adoecido em suas rotinas. Para o pesquisador Danilo Ferreira de Camargo, o adoecimento desses profissionais mostra o quanto o cotidiano de Professores e Alunos nos colégios é “insuportável”. “Eles revelam, mesmo que de forma oblíqua e trágica, o contraste entre as abstrações de nossas utopias pedagógicas e a prática muitas vezes intolerável do cotidiano Escolar”, afirma.
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O tema foi estudado pelo historiador por quatro anos, durante mestrado na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). Na dissertação O abolicionismo Escolar: reflexões a partir do adoecimento e da deserção dos Professores , Camargo analisou mais de 60 trabalhos acadêmicos que tratavam do adoecimento de Professores.
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Camargo percebeu que a “epidemia” de doenças ocupacionais dos Docentes foi estudada sempre sob o ponto de vista médico. “Tentei mapear o problema do adoecimento e da deserção dos Professores não pela via da vitimização, mas pela forma como esses problemas estão ligados à forma naturalizada e invariável da forma Escolar na modernidade”, diz.
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Desistência: Salários baixos provocam fuga de Professores da carreira
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 Luciana começou a adoecer em 2007 e está há dois anos afastada. Espera não ser colocada de volta em um colégio. “Tenho um laudo dizendo que eu não conseguiria mais trabalhar em Escola. Eu não sei o que vão fazer comigo. Mas, como essa não é uma doença visível, sou discriminada”, conta. A Professora critica a falta de apoio para os Docentes nas Escolas. “Me sentia remando contra a maré. Eu gostava do que fazia, era boa profissional, mas não conseguia mudar o que estava errado. A Escola ficou ultrapassada, não atrai os Alunos. Eles só estão lá por obrigação e os pais delegam todas as responsabilidades de educar os filhos à Escola. Tudo isso me angustiava muito”, diz.
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Viver sem Escola: é possível?
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 Orientado pelo Professor Julio Roberto Groppa Aquino, com base nas análises de Michel Foucault sobre as instituições disciplinares e os jogos de poder e resistência, Camargo questiona a existência das Escolas como instituição inabalável. A discussão proposta por ele trata de um novo olhar sobre a Educação, um conceito chamado abolicionismo Escolar.
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“Criticamos quase tudo na Escola (Alunos, Professores, conteúdos, gestores, políticos) e, ao mesmo tempo, desejamos mais Escolas, mais Professores, mais Alunos, mais conteúdos e disciplinas. Nenhuma reforma modificou a rotina do cotidiano Escolar: todos os dias, uma legião de crianças é confinada por algumas (ou muitas) horas em salas de aula sob a supervisão de um Professor para que possam ocupar o tempo e aprender alguma coisa, pouco importa a variação moral dos conteúdos e das estratégias didático-metodológicas de Ensino”, pondera.
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Fora da sala de aula: Metade dos Professores não leem em tempo livre
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Ele ressalta que essa “não é mais uma agenda política para trazer salvação definitiva” aos problemas Escolares. É uma crítica às inúmeras tentativas de reformular a Escola, mantendo-a da mesma forma. “A minha questão é outra: será possível não mais tentar resolver os problemas da Escola, mas compreender a existência da Escola como um grave problema político?”, provoca. Na opinião do pesquisador, “as mazelas da Escola são rentáveis e parecem se proliferar na mesma medida em que proliferam diagnósticos e prognósticos para uma possível cura”.
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Problemas partilhados
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Suzimeri Almeida da Silva, 44 anos, se tornou Professora de Ciências e Biologia em 1990. Em 2011, no entanto, chegou ao seu limite. Hoje, conseguiu ser realocada em um laboratório de ciências. “Se eu for obrigada a voltar para uma sala de aula, não vou dar conta. Não tenho mais estrutura psiquiátrica para isso”, conta a carioca. Ela concorda que a estrutura Escolar adoece os profissionais. Além das doenças físicas – ela desenvolveu rinite alérgica por causa do giz e inúmeros calos nas cordas vocais –, Suzimeri diz que o ambiente provoca doenças psicológicas. Ela, que cuida de uma depressão, também reclama da falta de apoio das famílias e dos gestores aos Professores.
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“O Professor é culpado de tudo, não é valorizado. Muitas crianças chegam cheias de problemas emocionais, sociais. Você vê tudo errado, quer ajudar, mas não consegue. Eu pensava: eu não sou psicóloga, não sou assistente social. O que eu estou fazendo aqui?”, lamenta.
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Fonte: IG (on line)

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