domingo, 9 de setembro de 2012

Arte para combater a violência

Por MARISA LOURES
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Uma passagem inusitada e que se abre para o fantástico mundo da arte literária. Ao ultrapassá-la, a criança está, de vez, entregue aos encantos de Dionísio. Feita de madeira e mandalas, a porta mágica foi construída no andar superior da Escola Municipal Jerônimo Vieira Tavares, localizada no Bairro Dias Tavares, para dar acesso a um espaço de contação de histórias e apresentações teatrais - projeto realizado por alunos do colégio, sob a coordenação da professora de português Rosana Vidal. Criada há 12 anos, a iniciativa contribui para a redução da criminalidade e favorece a formação de jovens interessados em se profissionalizar nas artes dramáticas.
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"É um trabalho rico. Quando entrei aqui, não sabia a dimensão. Foi a partir disso que resolvi me aperfeiçoar", diz o estudante Kleyton Machado, 19, que, depois de ter feito parte das ações, passou pelo Mergulhão Teatral do Centro de Estudos Teatrais Grupo Divulgação, foi membro da trupe comandada por José Luiz Ribeiro e, hoje, integra o Grupo de Pesquisa em Interpretação e Experimentação Cênica, coordenado por Renata Rodrigues e Gabriela Machado, na Funalfa.
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"Muita coisa mudou na minha vida e na de meus amigos. O pessoal que começou a fazer teatro comigo aqui na escola está todo envolvido no meio cultural. Alguns estudam letras, música e até teatro", ressalta Kleyton, acrescentando que, para o futuro, sonha realizar oficinas de jogos teatrais, com uma amiga, em escolas, baseando-se nos autores Viola Spolin e Peter Slade. "Quero passar para frente o que aprendi." O ano era 2000. Por iniciativa da professora Rosana Vidal, o Balaio de Gato e o Tearte - grupos de contação de história e de teatro, respectivamente, compostos por alunos do ensino fundamental - tomaram forma. O objetivo inicial era acabar com a violência e fazer com que as crianças se mantivessem por mais tempo na escola. "Havia uma onda de briga nos rondando. Alguns alunos se envolviam em confusões com jovens de outros bairros. Com a inserção do projeto, nosso colégio ficou mais atrativo e os estudantes passaram a vir para aula com boa vontade, não precisamos obrigá-los. Como são realizadas dinâmicas de grupo, as crianças e os adolescentes ficaram mais unidos", destaca a diretora Adriana Vallotte Balieri.
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Durante todo o ano, Rosana prepara peças teatrais e espetáculos de contação de histórias, que são apresentados, não só ao público interno do colégio, mas também à comunidade. Um trabalho que se resumia a pequenas encenações dentro da escola, devido ao boca a boca, hoje chega a outros estabelecimentos de ensino. Por meio de pequenos atores, histórias como "A bruxinha que era boa" e "Pluft, o fantasminha", de Maria Clara Machado, chegam a centenas de espectadores. O que no início era uma atividade voluntária, 12 anos depois faz parte de um projeto político e pedagógico da Prefeitura. Se antes era necessário se dividir entre as salas de aula e a coordenação do Tearte e do Balaio de Gato, hoje a professora se dedica, exclusivamente, aos grupos. De acordo com Rosana, além de formar público, o trabalho proporciona um resultado considerável no rendimento escolar da garotada."É um projeto interdisciplinar. Ajuda a melhorar a escrita, a leitura, a interpretação de texto e até o aprendizado do conteúdo de outras disciplinas como história e geografia, por exemplo." A aluna do sexto ano, Thamirys Sobreira,11, que o diga. "Ao mesmo tempo que descubro mais sobre teatro aprendo as outras matérias com mais facilidade."
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No andar superior do colégio, o terraço se transforma em um verdadeiro teatro com direito a palco montado com estruturas de madeira. Para compor o ambiente propício a um espetáculo teatral, bem ao lado do tablado, uma espaçosa sala foi construída para ser o camarim. Pendurados em araras, cabides abrigam figurinos confeccionados pelas próprias crianças ou doados pela população. Se a qualidade do que é utilizado e apresentado é modesta, a vontade de inserir os jovens estudantes no meio cultural é pretensiosa. "A escola não tem o intuito de formar atores, mas, sim, possibilitar o conhecimento da arte", observa Rosana.
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Contrariando ou indo além dos simples objetivos da professora, ao sentir as luzes da ribalta, os atores mirins não pensam em outra coisa a não ser seguir os passos de Kleyton e de tantos outros que já passaram por lá e que hoje estão desenvolvendo atividades no meio teatral."Tenho vontade de aprender cada vez mais. Aprendo histórias interessantes, quero ser professora e atriz. Quando estamos no palco, a sensação é tão boa que esquecemos de tudo. Se tivermos um problema na família, nem lembramos dele", diz Leandra Marques de Avelar, 13, aluna do 7º ano do ensino fundamental."Participando do contadores de histórias e do teatro, posso mostrar para meus colegas um pouco do meu trabalho. A escola ficou mais legal", conclui Felipe Sobreira, 11, aluno do sexto ano. Entre os dias 27 e 31 de agosto, 57 escolas da cidade participaram do Literatudo - projeto realizado com o objetivo de divulgar o trabalho desenvolvido com os estudantes da rede municipal, ao longo do ano letivo. Foi uma semana de extensa programação cultural, que incluiu apresentações teatrais, sessões de cinema, rodas de conversa, contação de histórias, artesanato e shows musicais. A interação entre os estabelecimentos de ensino se deu por meio de visitas entre os colégios. Enquanto um estava no palco, o outro ficava na plateia. Na Escola Municipal Jerônimo Vieira Tavares, por exemplo, além de o Balaio de Gato e o Tearte fazerem suas apresentações, uma das grandes atrações foi a tenda de leitura. Montada dentro da biblioteca, a barraca serviu de cenário para a promoção da leitura entre os alunos.
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Fonte: Tribuna de Minas (JF - MG)

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