sexta-feira, 23 de setembro de 2011

O chão de Minas continua tremendo: pelo piso, pela carreira, pelas liberdades



Por Professor Euler

A cada dia destes 107 dias de greve somos surpreendidos pela energia criadora da nossa brava gente em toda Minas Gerais. Cada educador e educadora que participa deste movimento traz no corpo e na alma o testemunho da história que estamos escrevendo. Da história real, que eu pretendo, após a greve, transformar num livro, que será obviamente modesto, um recorte apenas das infinitas ações, das palavras, dos textos e das imagens produzidas nestes dias.

No fundo, o mais bonito não será o que dirão, muitas gerações após, mas aquilo que cada um de nós, com a nossa singular experiência, está vivendo de forma individual e junto ao coletivo. Em cada um dos milhares de comentários publicados neste blog (uma média de 200 por dia), nestes 107 dias, deparamo-nos com um olhar único, uma crítica, uma sugestão, uma narrativa do que se passa na escola, na vida pessoal, ou na cidade, das diferentes regiões de Minas.

Antigamente, eu costumava colocar quatro ou até cinco posts na página da frente do blog. Mas, o material que chega - vídeos, fotos, textos, charges - é tão rico e diversificado que tive que reduzir o número de posts, até chegar a um único post por dia. Tal medida se fez necessária para reduzir ao máximo o "peso" da página, levando em conta que a banda larga disponível em média é ainda muito lenta. E como eu sinto não poder publicar todos os vídeos e imagens que chegam ou são indicados aqui. Mas, pelo menos os links são socializados nos comentários, estando abertos à visitação nesta enorme enciclopédia virtual e interativa que a Internet proporcionou.

E é impressionante observarmos, através desse rico material, o alcance da nossa greve, que o governo tenta diminuir e mentir, ao dizer, por meio da mídia de aluguel, que a greve se restringe à região da Grande BH. A todo momento nestes 107 dias eu publiquei aqui material de várias cidades de Minas, das mais diferentes regiões, onde os bravos e bravas guerreiros e guerreiras realizaram e realizam diferentes manifestações de protesto pelo não pagamento do piso.

Minas nunca mais será a mesma depois da nossa maravilhosa e heroica greve. Toda a máquina de poder e de terror construída durante a gestão do faraó e mantida por seu afilhado, reunindo os poderes constituídos e a mídia e poderosos grupos econômicos começa a quebrar-se. Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia, dizia o poeta.

Vimos hoje uma parte da mídia, através da TV Record, quebrar a censura que tem sido imposta nos últimos anos, e começando a mostrar o outro lado da realidade apresentada oficialmente pelo governo. Vimos como os educadores têm sido tratados nestes 107 dias, de forma humilhante, como se na escravidão ainda vivêssemos.

O povo mineiro pode testemunhar a arrogância das elites, representadas por deputados e assessores que fazem pouco caso dos de baixo, são incapazes de manter um diálogo honesto e democrático com aqueles que dizem representar, enquanto atuam com servilismo ao governo imperial.

Mas, ao mesmo tempo que este choque direto entre as elites dominantes e educadores é apresentado através das lentes de um vídeo, acompanhamos também o testemunho de várias professoras e professores, que dedicaram 20, 25 ou 30 anos de sua vida ao magistério, sendo tratados com desdém nas escolas, num jogo sórdido e marcado por chantagens urdidas maquiavelicamente nos frios gabinetes dos que detêm o poder em Minas Gerais. Com requintes de crueldade e sadismo, beirando à tortura psicológica, o governo de Minas anuncia pela mídia bandida que contratará substitutos e que demitirá designados; ao mesmo tempo, manda que seus capitães do mato (aqueles diretores sem caráter que se prestam a tal serviço) telefonarem para os professores e professoras ameaçando-os de forma "sutil": "Olha, se você não voltar para ocupar o seu cargo, vou ter que contratar um substituto". Que humilhação, que coisa ultrajante, que baixaria, além da ilegalidade, este governo se dispõe a praticar para atingir o objetivo de destruir a nossa greve e deixar de cumprir uma lei federal que instituiu o piso salarial nacional.

Seria o caso até dos órgãos de Direitos Humanos convocarem os governantes de Minas - do mais alto escalão até o diretor da escola, que atua como capitão do mato - para prestarem depoimento pela prática de tortura psicológica, crueldade, sadismo e assédio moral, que vem acontecendo em grande escala em Minas Gerais. Isto com uma categoria que tem como missão contribuir com a formação crítica, moral, ética e humanista de muitas gerações. Mas, está claro também que a nossa brava turma de educadores não aceita tal conduta indecente do governo sem resistência, sem luta despojada e cada vez mais corajosa. Basta ver os registros em imagens, filmes, textos e depoimentos pessoais. A cada dia, uma surpresa para se contrapor ao ataque do governo contra a categoria.

Uma parte da mídia ainda continua totalmente a serviço do governo - e aqui eu quero nomear, para que as milhares de pessoas que acessam este blog decidam o que fazer em relação a esta mídia. Vou citar aqui o péssimo exemplo da Rádio Itatiaia, que tem uma razoável audiência e que poderia realizar um trabalho jornalístico mais sério e isento, mas se presta a reproduzir a vontade do rei. Logo pela manhã a única referência que ouvi desta emissora - que é uma concessão pública e como tal deveria ter respeito pela população de baixa renda - sobre a nossa greve foi a lacônica nota que dizia que os professores já estavam voltando para as escolas e que estas retomavam seu trabalho normal. Não visitaram uma escola sequer; não entrevistaram um único dos 10 mil educadores que semanalmente realizam as mais belas assembleias no pátio da ALMG. Uma vergonha para Minas ter uma mídia com esta conduta, como a Itatiaia, o jornal Estado de Minas, o jornal Hoje em Dia, a TV Globo Minas e a TV Alterosa.

Na reunião que tivemos hoje pela manhã com dezenas de estudantes da FAFICH / UFMG, este tema da ausência de democracia dos meios de comunicação foi debatido. Já passa da hora de construirmos alternativas de comunicação, como aliás já vem acontecendo com os blogs e demais redes sociais pela Internet. Mas, é preciso cobrar também dessas emissoras que detêm o monopólio da comunicação, que tenham respeito pela sociedade mineira dos de baixo. Se for o caso, se estas emissoras não se dispuserem a abrir mais para a participação dos de baixo, não podemos descartar a possibilidade de uma ampla campanha de boicote a essas emissoras. Elas que sobrevivam sem audiência, apenas com as verbas de publicidade do governo que gasta milhões anualmente com propaganda, enquanto se recusa a nos pagar um miserável piso. Nos próximos dias, o nosso movimento deve assumir um caráter ainda mais ofensivo, afim de forçar uma negociação com um governo que já demora a perceber que o capital político de que dispõe se esvai a passos acelerados. Cada vez mais grupos e forças e movimentos sociais apoiam o nosso movimento. Para a próxima segunda-feira, por exemplo, está marcada uma concentração de centenas de apoiadores na Praça da Estação, centro de BH, a partir das 15h. Vários pais de alunos, estudantes, movimentos sociais os mais diversos, estão sendo convidados a se unirem a esta luta em prol de uma causa comum, que é a Educação pública de qualidade para todos, com a consequente valorização dos educadores.

Além disso, em toda Minas acontecem manifestações. Em Montes Claros, por exemplo, um grupo de educadores se acorrentou em frente à SRE da região, neste ato que tem sido um símbolo da divulgação da luta e do protesto contra o estado de exceção instalado em Minas Gerais. Também na cidade de Caratinga um grupo de educadores, apoiados pelos estudantes, ficaram acorrentados em frente à SRE e realizaram ato de protesto na parte central da cidade. Em vários outros municípios mineiros acontecem protestos diariamente.

O governador do estado já não pode visitar qualquer cidade de Minas, pois, por onde passa é cercado e caçado por grupos de educadores do NDG (Núcleo Duro da Greve), como aconteceu recentemente em Diamantina. Por outro lado, na ALMG permanece a vigília realizada por incansáveis educadores em greve, que dormem nas barracas e até na escadaria, passando todo o dia em marcação nas entradas e garagens daquela Casa, que deveria ser do povo, mas não o é. Graças a estes valentes educadores, uma sessão legislativa foi hoje interrompida, enquanto uma audiência que era realizada na Comissão de Direitos Humanos foi praticamente ocupada pelos educadores, colocando na pauta o problema vivido hoje em Minas Gerais. Os episódios envolvendo a infeliz frase de um assessor do líder do governo - a de que se ganhasse 712 reais ele seria servente de pedreiro - acabou causando grande desconforto nas hostes do governo. As reportagens da TV Record, que publicamos no post anterior, com a participação de uma combativa professora e a atuação do deputado Rogério Correia contribuíram para esquentar a batata nos pés do governo. E para completar, a greve de fome realizada desde o dia 19 por dois colegas nossos no hall de entrada da ALMG coloca o governo cada vez mais numa situação delicada.

O governo montado na base de uma concepção positivista e neoliberal tem grande dificuldade para entender que a força bruta, a chantagem, o terrorismo psicológico, o corte dos salários, não vão resolver os dilemas criados pelo próprio governo, ao não pagar o piso salarial, que é um direito constitucional dos educadores.
Ainda mais agora, quando se noticia que o novo piso do MEC para janeiro de 2012, se não for o anunciado valor de R$ 1.385,00, será aquele que este blog tinha revelado ainda em abril deste ano: R$ 1.450,00, graças ao reajuste de 22% pelo custo aluno ano entre 2010 e 2011. E se somarmos a estes dados o anúncio de que Minas receberá um aporte financeiro de R$ 1,2 bilhão de reais, podendo inclusive solicitar complementação caso comprove não poder pagar nosso piso, não resta mais qualquer pretexto para o governo continuar nos enganando.

O governo precisa reconhecer que o golpe do subsídio, que representa um confisco de R$ 2 bilhões por ano no bolso dos educadores, não colou. E que, para garantir o pagamento do piso e a salvação da carreira, os educadores em greve estão (estamos) dispostos a levar essa luta até o fim, ou seja, até a nossa vitória.


Que o governo se dê conta dessa realidade objetiva e subjetiva construída em Minas Gerais e mude a sua atitude de arrogância e prepotência. Antes que seja tarde, e que a população mineira dos de baixo, ao invés de cobrar uma negociação para o pagamento do piso, comece a cobrar o fim deste governo. Entre perder R$ 2 bilhões reservados para os de cima, em favor dos de baixo, e perder o poder, talvez a primeira opção seja a mais conveniente. Inclusive para o patrocinador do governo atual, que se esconde, e até agora tem se omitido vergonhosamente, já mostrando para o povo brasileiro o que se pode esperar daqueles que pleiteiam o governo federal. Realidade que atinge tanto o senador-faraó, quanto o ex-presidente da república e a atual presidenta, todos igualmente omissos em relação ao problema da Educação básica e à valorização dos educadores, em Minas e no Brasil.

Um forte abraço a todos e força na luta, até a vitória!
Do Blog do Euler - http://blogdoeulerconrado.blogspot.com/2011/09/o-chao-de-minas-continua-tremendo-pelo.html

Um comentário:

  1. O Euler faz o dever de casa certinho, mas muitos colegas... imagine uma escola com 90% dos professores em greve funcionando normal por ter professores tampões! É !!! Tô pasma...
    professorabernadete.blogspot.com

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