quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Adolescente infrator vive em condição precária em cadeias

FOTO: LUIZ SILVEIRA/AGÊNCIA CNJ
Absurdo. Visitas da equipe do CNJ mostraram adolescentes detidos em celas de penitenciárias; há também denúncias de maus-tratos
LUIZ SILVEIRA/AGÊNCIA CNJ
Absurdo. Visitas da equipe do CNJ mostraram adolescentes detidos em celas de penitenciárias; há também denúncias de maus-tratos
Por Gláucia Giúza
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Um estudo divulgado nesta semana pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre as instituições socioeducativas de Minas traz uma triste realidade. Além de denúncias de maus-tratos e detenção precária, o documento revela que um grande número de jovens cumpre medidas de internação em cadeias e estabelecimentos penitenciários. O relatório traz também situações degradantes impostas aos adolescentes que deveriam ser preparados para o retorno à sociedade.

O documento descreve casos em que adolescentes infratores ficam em penitenciárias e cadeias por um prazo maior que os cinco dias permitidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Alguns internos afirmam ter recebido tratamento ofensivo e degradante.
Outros alegam que foram mantidos presos com uma prática conhecida como "escorpião", quando têm pés e mãos amarrados a correntes presas a algemas. Outra técnica usada para prender os jovens seria, segundo os entrevistados, a "Jesus Cristo", em que as mãos são algemadas e presas para cima, em posição semelhante à de uma cruz. Os agentes educativos estariam usando roupas como as de policias, o que é proibido por lei.
Apuração. A assessoria da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) disse que eles foram informados do resultado logo após a conclusão do relatório, em junho. Desde então, todos os adolescentes que estavam nas unidades prisionais foram liberados - eles estão cumprindo outras medidas socioeducativas ou foram encaminhados a centros apropriados. Sobre as denúncias de agressividade, a Seds afirma que os monitores devem seguir o protocolo do Procedimento Operacional Padrão, documento que traz orientações sobre uso de força e ‘algemação’ dos adolescentes. A secretaria disse que está fazendo seu próprio relatório para acompanhar o caso de perto e que as denúncias de maus-tratos serão apuradas - caso confirmadas, os funcionários serão punidos. O Estado destaca que o relatório traz também o reconhecimento de que o sistema estadual está em ‘linha de melhorias’.
As visitas foram realizadas em março, em 19 unidades de internação e 12 varas da infância e da juventude em várias regiões do Estado.
Crítica
Para deputado, situação é pior e relatório, omisso
O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Durval Ângelo, confirmou as denúncias do relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas fez várias críticas. Segundo ele, as irregularidades são ainda mais graves e o relatório é "omisso, superficial e corporativista". Segundo o deputado, a comissão apura a morte de pelo menos 30 adolescentes infratores, nos últimos três anos, que estavam sob a custódia do Estado. Durval afirma ainda que dois agentes educacionais pediram proteção policial após receberem ameaças de colegas de trabalho por denunciar em casos de tortura em unidades.
"O relatório não cita essas situações. Os próprios juízes não cumprem a lei. É lamentável que o CNJ tenha gastado tanto recurso para fazer um levantamento que é conivente com a ilegalidade", denuncia. O deputado afirma ainda que a comissão não foi consultada pelo CNJ sobre a realidade nas unidades de Minas.
O outro lado. O desembargador Wagner Wilson Ferreira, superintendente da Coordenadoria da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), reconhece as deficiências apontadas no relatório e afirma que a Justiça trabalha para impedir que os adolescentes fiquem em unidades prisionais destinadas a adultos. Ele também reconhece os abusos citados no documento e diz que as denúncias estão sendo apuradas.
Sobre a declaração do deputado de omissão dos juízes, ele afirmou que o CNJ já denunciou essa realidade. "Respeito o deputado, mas não concordo com ele. O Judiciário está empenhado em resolver essa situação", disse. (CG)
Mini entrevista com Maria Frota
"Os jovens podem ficar piores"
É ruim para os adolescentes ficarem em penitenciária em meio aos adultos?
Sim. O maior problema é que esses adolescentes precisam de medidas socioeducativas específicas para eles. Essa reabilitação não é feita no sistema carcerário que atende os adultos.
De que forma deve ser cumprida essa medida socioeducativa? Há uma série de medidas a serem aplicadas. As principais são manter um convívio com a família, que é importante em seu processo de formação, e continuar os estudos para que eles desenvolvam o lado intelectual, o que facilita a reabilitação.
Como esses adolescentes saem dessas penitenciárias? Eles não são reabilitados e não vão conseguir se reinserir na sociedade. A maioria vai provavelmente continuar cometendo crimes. Eles estão em processo de formação de caráter e só a punição da privação de liberdade sem as medidas socioeducativas pode torná-los ainda piores. (Natália Oliveira)
Relatório
O relatório do CNJ é a conclusão de um trabalho de radiografia das medidas socioeducativas de internação no Estado como parte do Programa Justiça ao Jovem. Três grupos formados por um juiz e quatro técnicos e servidores de cartório visitaram 19 unidades de internação e 12 varas da infância e da juventude – Uberaba, Uberlândia, Patrocínio, Pirapora, Montes Claros, SeteLagoas, Teófilo Otoni, Governador Valadares, Divinópolis, Juiz de Fora, Ribeirão das Neves e Belo Horizonte

Minas Gerais tem hoje 20 unidades para cumprimento de medida socioeducativa de internação e internação provisória; são mil vagas. Ainda em 2011, será inaugurado um centro socioeducativo em Belo Horizonte com capacidade para 56 adolescentes. Também está sendo construída uma unidade em Unaí, com 90 vagas.

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