quinta-feira, 28 de julho de 2011

Brasil sem miséria?

PM de plantão nos colégios

Com o objetivo de reduzir a violência nas unidades da rede pública, 40 escolas passam a contar com a presença de policiais nos três turnos

.

Desde ontem, 40 Escolas da rede pública de ensino contam com a presença de policiais militares em tempo integral. Os PMs estarão dentro dos colégios e farão rodas internas e nos arredores nos três turnos de atividades. A iniciativa faz parte de um programa que pretende combater a violência e o tráfico de drogas nas instituições. Além do policiamento, palestras e atividades lúdicas que visam combater o bullying e a dependência química serão organizadas pela Secretaria de Educação, com o intuito de conscientizar alunos e também as comunidades que receberam o projeto. De acordo com o secretário de Segurança, Sandro Avelar, o governo tem a intenção de aplicar nas Escolas a filosofia de policiamento comunitário para aproximar alunos, professores, diretores, pais e moradores das cidades.

O lançamento do programa Muita Calma Nesta Escola ocorreu na manhã de ontem no Centro de ensino médio 4 (CED 4) do Guará, que, em abril deste ano, foi palco de uma briga entre professores, alunos e policiais (Leia memória). Segundo Avelar, a escolha foi simbólica e representa uma mudança nas políticas de segurança pública.

“As equipes vão estabelecer uma relação de confiança com a comunidade e estão preparadas para o desafio. Um policial trabalhará de manhã, outro à tarde e mais dois durante a noite”, afirmou.

O comandante do Batalhão Escolar da Polícia Militar, Eduardo Leite Souza, explicou que esse programa também vai resgatar um trabalho desenvolvido anteriormente pela corporação. Segundo Souza, o grupamento conta atualmente com 516 militares e a extensão da iniciativa está relacionada ao aumento do efetivo.

“Quando o Batalhão Escolar foi criado, em 1989, havia policiais fixos nas Escolas. Agora, vamos retomar esse trabalho. Com o aumento do número de soldados, mais Escolas serão contempladas. As outras unidades de Educação que não integram as 40 escolas escolhidas inicialmente também receberão reforço nas rondas móveis e com policiais a pé”, acrescentou.  Na avaliação do governador do DF, Agnelo Queiroz, esse trabalho visa criar uma cultura de paz para garantir a segurança da comunidade Escolar.

“Os alunos, pais, diretores eprofessores querem segurança nas salas de aula para desenvolver a atividade educativa. Também pretendemos levar isso para as Escolas privadas”, pontuou.

Para o diretor do CED 4, Antônio José Rodrigues, as drogas são responsáveis por criar os principais problemas nos colégios do DF. Segundo Rodrigues, o acesso aos entorpecentes está cada vez mais fácil e as dificuldades se multiplicam quando os pais dos alunos não acreditam que os filhos são usuários de drogas.

“Com a presença da polícia vamos diminuir os casos relacionados a droga e teremos um colaborador diário no combate a qualquer ilegalidade”, comentou.

Fonte:Correio Brasileinse (DF) - Todos pela educação

Ao mestre, com carinho.

Proposta cria política de prevenção à violência contra professores

Agência Câmara (27/07/2011)

A Câmara analisa o Projeto de Lei 604/11, do deputado Manoel Junior (PMDB-PB), que cria a política de prevenção à violência contra os profissionais do magistério público e privado. Além de campanhas educativas sobre a questão, a proposta prevê medidas punitivas como o afastamento temporário ou definitivo do aluno ou funcionário violento ou a transferência do estudante infrator. Segundo o texto, o professor poderá se licenciar quando estiver em situação de risco sem perda de vencimentos. O projeto equipara os professores de escolas particulares, desde a educação básica até o ensino superior, a agentes públicos para medidas de punição.

Agressões frequentes : Segundo o autor da proposta, as agressões sofridas por educadores se tornam cada vez mais frequentes e graves no cotidiano das escolas brasileiras. “Tais agressões não se configuram somente no aspecto físico, sendo registrados números significativos de agressões verbais, furtos e vandalismo, entre outras manifestações de violência”, afirmou Manoel Junior. A proposta também quer estimular a discussão sobre atos de violência física e moral nas escolas, universidades e comunidades, com a participação de entidades de estudantes e acompanhamento dos ministérios da Justiça e da Educação.

Tramitação: A proposta tramita apensada aos PLs 732/11 e 1225/11 nas comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; de Educação e Cultura; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, inclusive no mérito. Em seguida será votada pelo Plenário.
.
Íntegra da proposta:
Reportagem – Tiago Miranda
Edição – Regina Céli Assumpção

Fonte: Todos pela Educação

quarta-feira, 27 de julho de 2011

POR UM COLETIVO DA EDUCAÇÃO INFANTIL DA REGIÃO METROPOLITANA DE BH



No dia 20 de junho aconteceu uma reunião na UMEI Alaíde Lisboa que contou com a presença de 230 pessoas indignadas com a fala desrespeitosa da secretaria de educação em relação à educação infantil. Na ocasião foram elaboradas propostas de encaminhamentos para a luta em defesa da educação infantil e pela unificação da carreira docente de BH.
No dia 29 de junho aconteceram no SindREDE/BH reuniões de representantes de UMEIS e escolas de/ com turmas de educação infantil que definiram por um dia de greve: 05 de julho. Posteriormente, esse dia foi ampliado para o conjunto da categoria a fim de cobrar da PBH o envio do projeto de reajuste para a Câmara Municipal. A greve contou com 90% de paralisação da educação infantil. A porta da PBH e a Praça Sete foram ocupadas por adultos e algumas crianças para exigir do prefeito respeito às professoras da educação infantil e o pagamento do reajuste proposto no início do ano. Ao final do ato uma comissão de professoras da educação foi até a SMED entregar pessoalmente à Sra. Macaé os projetos pedagógicos elaborados e desenvolvidos nas UMEIS e escolas de/ com turmas de educação infantil.
Avaliamos que a mobilização da educação infantil foi fundamental para expor a política de desvalorização das professoras desta etapa da educação básica. Diversas cartas redigidas por pais, mães, sindicatos e academias, estão circulando pela cidade e internet em apoio ao trabalho realizado na educação infantil de Belo Horizonte, manifestando a indignação da cidade diante da discriminação das professoras. A mobilização, da educação infantil e outros segmentos da educação, pressionou o prefeito a enviar o projeto de reajuste salarial para a Câmara Municipal, encaminhado no dia 07 de julho. E é com esta mesma mobilização que esperamos continuar lutando pelo reconhecimento salarial, político e pedagógico do trabalho desenvolvido diariamente nas UMEIs e escolas de/ com turmas de educação infantil. Para garantirmos uma articulação política mais ampla, acreditamos ser necessária a constituição de um espaço coletivo permanente de elaboração política, para garantir propostas concretas de intervenção nos rumos da política da educação infantil para a cidade em termos da unificação da carreira do educador infantil ao do professor e garantia à educação das crianças pequenas da cidade. Esse espaço não é uma instância sindical, que permanece sendo essencial na luta. O sindicato, locus de organização da categoria, através das reuniões de representantes de escolas, UMEIs, assembléias e congressos, é um dos agentes na luta pela educação infantil. Mas, há também pulverizado pela cidade outros espaços já institucionalizados: luta das mulheres (Marcha Mundial de Mulheres, Movimento de Luta pró-creche); Conselho Municipal de Educação e de Direitos da Criança e do Adolescente; Conselhos Tutelares; Defensoria Pública; Fórum Mineiro de Educação Infantil; Partidos Políticos; Câmara Municipal e Assembléia Legislativa; entre outros. Reunir e discutir com todas as pessoas que tem acumulo na área da educação infantil é neste momento importantíssimo na nossa luta.
.
Pretendemos constituir um espaço de elaboração política para intervirmos, diretamente, nos debates da educação infantil na cidade, dialogando com o setor público da região metropolitana e o setor privado do sistema municipal de educação de BH, assim como com as universidades (UEMG, UFMG), os sindicatos (SindREDE/BH, SINPRO, SindUTE/MG), os movimentos sociais, em especial as mulheres que lutam por creches.
.
Por isso, no dia 11 de julho fizemos um primeiro encontro organizativo e definimos por chamar uma reunião para o dia 04 de agosto, a partir das 18 horas, na UMEI São Gabriel, para ampliarmos essa discussão. Nesta reunião vamos conversar sobre o funcionamento deste Coletivo da Educação Infantil, nossa política, ações e a agenda de intervenções do período. Precisamos divulgar encaminhamentos já realizados neste mês de julho e propor ações para o próximo período:
1) Ações Políticas
a) Seminário sobre Regimento Escolar - agosto/setembro;
b) Ação na Ciranda da Infância - 02/09;
c) Ação na Audiência do Conselho Municipal de Educação - 06/10;
d) Criar um link nos blogs "Cartas para a Macaé" para divulgarmos todas as cartas que chegam às escolas de apoio a nossa luta
2) Ações Formativas
a) Curso de Formação sobre Plano de Carreira (estamos aguardando o retorno do Núcleo de Educação Infantil da UFMG)
b) Curso Arte na Educação Infantil (Cristina Borges esta em contato com a professa Rosvita da UEMG)
.
Nossos desafios são muitos e precisamos de todas na luta. Venham participar do Coletivo da Educação Infantil da Região Metropolitana de BH.
.
Esperamos vocês no dia 04 de agosto, quinta-feira, às 18 horas, na UMEI São Gabriel.
.
Para chegar é fácil:
a) metrô São Gabriel, pegar integração 810 ou 811, descer na Praça do Epa; na região da Pampulha pegar S53, descer na Praça do Epa;
b) na região do Barreiro tem o 8350 (passa pela BR), pode descer na PUC, primeiro ponto, e seguir a pé ou descer na Estação São Gabriel e pegar o 810 ou 811 e descer na Praça do Epa;
c) da UMEI Carlos Prates, pegar 3503 (descer na Praça do Epa) ou 3502 (pedir para descer perto da E. M. Osvaldo França Junior).
.
Assinam:
Antonieta - UMEI Carlos Prates
Cristiane - UMEI São Gabriel / EMOFJ
Cristina Borges - UMEI Ouro Minas
Consolação - EMCRT e FaE/UEMG
Daniela - UMEI Alaide Lisboa
Jacinta - UMEI Carlos Prates
Thais - UMEI São Gabriel
.
Enviado por Consolação

segunda-feira, 25 de julho de 2011

O professor na encruzilhada: entre estudantes e a instituição escolar


Lúcio Alves de Barros*
.
A Justiça de Minas Gerais colocou fim na discussão jurídica sobre o assassinato do professor e mestre em educação física Kassio Vinicius Castro Gomes, de 39 anos. O estudante Amilton Loyola Caires, de 24 anos, foi considerado inimputável com base em um laudo de sanidade mental o qual comprovou que o estudante possui esquizofrenia. O crime aconteceu em dezembro de 2010 no Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, considerado uma das mais tradicionais redes de ensino em Belo Horizonte. Explicar a família o desfecho da história será um problema e não creio que a justificativa possa apagar o giz do quadro dramático que, certamente, não teve início naquela organização escolar. De todo modo é bom sempre lembrar o acontecimento, não somente pela crueldade e pelo motivo torpe, mas principalmente devido aos inúmeros acontecimentos de violência(s) que vem acontecendo nas escolas (públicas e privadas), faculdades e universidades. Um argumento me parece bastante forte.
.
Longe da esquizofrenia do garoto, há tempos assistimos o descaso, a desvalorização e o desrespeito com o professor. A mercantilização da educação que inegavelmente levou o “curso superior” a muitos estudantes não deixou de produzir efeitos perversos e inesperados. Como é próprio da natureza das relações de mercado, quem possui o capital pode pagar (quase) tudo. Dito de outra forma, caso o estudante faça parte daqueles que tem o dinheiro em abundância e se interesse por um diploma de “nível superior” pode ele facilmente ser médico, advogado, engenheiro e tudo mais. E vejam que somente citei as profissões que no passado eram consideradas nobres e que hoje penam com sua também banalização. Com a porta de entrada aberta qualquer cachorro entra na igreja e esse é o caso do ensino superior. Já não existe seleção: é preciso antes somente saber se o candidato à vaga pode realmente pagar a mensalidade. Se ele pode bancar o custeio e ainda mostrar que mantém o pagamento sem maiores dificuldades o mercado cuida do resto. Aparece aqui a figura potente do cliente, um ser flexível, líquido, medíocre, perigoso, cheio de desejos e poder que devido ao dinheiro faz questão de bradar a velha frase: “estou pagando”. E aqui se encontra uma grande barreira no campo da educação. Esta barreira formada por alunos novos e velhos que sabem o valor do capital e das relações que ele é capaz de tecer. E como fazer para reprovar um cliente/capital sem possibilidades de ser violentado simbolicamente ou pragmaticamente. Impossível!
.
O docente, diante do muro do mercado formado por várias vozes que colocam em xeque o professor, assiste atônito a perda de sua autoridade, o respeito e o equilíbrio emocional e torna-se questão de tempo para que sua economia psíquica termine em tristeza, cansaço, desilusão e desistência. E basta uma palavra, uma reflexão com base em anos de estudos e pesquisas ou uma chamada de atenção por causa de um celular ligado e uma conversa informal e lá se foi mais uma mercadoria que deve ser ensacada e colocada frente ao vendedor para sofrer a recauchutagem ou a imediata troca. Este cliente é perigoso, não importa se o docente tem família, história de vida, mérito no trabalho, etc. O discente de hoje não quer colocar em prática os próprios esforços. Ele não busca o mérito e a excelência, busca o diploma - o canudo como se diz - e pronto. E quem atrapalha esses denominados estudantes clientes? A mercadoria falante e romântica chamada professor e que decidiu não abrir mão de sua autoridade, sapiência, integridade, dignidade, anos de estudos, méritos e princípios éticos.
.
Esse muro do mercado de diplomas, no qual vemos o professor funcionar como cerca elétrica e cacos de vidro, que o cliente aluno tenta ultrapassar sem dificuldades ainda sofre de outro problema. Como é de natureza do mercado, o "cliente tem sempre razão" e nesse caso nada como operar com a dúvida. Ao plantar a dúvida, raramente não aceita pelos gerentes, coordenadores, supervisores e diretores, os verdadeiros avatares do capital, o professor recebe a roupagem da culpabilidade que, em geral, é legitimada pelo aparelho autoritário e sem escrúpulos dos proprietários do mercado. O que causa mal-estar, talvez, nem seja os proprietários desses novos e velhos meios de produção de diplomas, mas os próprios docentes que acabam dando uma se pequena burguesia e operando em desfavor daqueles que antes eram iguais. A dúvida colocada, construída, trabalhada e legitimada acaba em cansaço, em atos litigiosos, discussões, fofocas sem fim e muita tristeza e resignação. O docente, de mera cerca e caco de vidro passa pela incrível metamorfose de ser o único culpado de todas e das várias mazelas e problemas que ainda vão estourar em salas de aula. A educação, definitivamente perdeu a essência do cuidado, do respeito ao outro, da diferença e da necessária emancipação humana na busca de mais e mais reconhecimento. Não deve ser por acaso que educadores reconhecidos já decretaram o fim da educação.
As relações sociais, latentes e manifestas, como a do caso do professor assassinado, no mercado educacional hoje são bem claras e só não percebe quem não deseja. De um lado os estudantes, entendidos como clientes, observadores do marketing educacional e que buscam um local no qual lhes garantirão menores custos e maiores benefícios em busca do título. Afinal, estão pagando e quanto mais barato, fácil e rápido melhor, não importando a qualidade e o conhecimento que se transformou em obstáculo na voz e nas ações pedagógicas levadas a efeito pelo professor. Do outro lado, temos os proprietários dos estabelecimentos de ensino e de sua pequena guarda burguesa, não raramente composta por professores incumbidos da função de limpar a área, chamar atenção dos "companheiros”, atender o cliente da melhor maneira possível, dar vida maior à dúvida quando jogada no ar, mostrar serviço forjado por ele mesmo e ganhar o dinheiro como se dono ele também fosse da organização. Neste campo, abre-se mão dos regulamentos internos, das hierarquias tácitas e das formais. A ideia é legitimar um culpado, um herege e nada melhor do que aquele que se encontra no meio do processo e que na verdade não passa de um apêndice da organização que pode mudar quantas vezes quiser as peças do xadrez. Em geral, os professores não nadam contra a maré, a maioria observa o sofrimento do outro e espera sua caída. A desgraça alheia é o meio eficaz para que o igual se sinta melhor e com possibilidades de crescimento em um mercado que não é competitivo, é seletivo. E seletivo porque deve ficar nele somente os que conseguem navegar em tais relações sem que elas atinjam em cheio suas subjetividades. Esta seleção é socialmente produzida. Não adianta ser verdadeiro, competente, honesto, ter um currículo respeitável, etc.
.
Em jogo, está a manutenção da clientela e não é por acaso que um dos problemas que vem enfrentando as organizações do ensino privado é a evasão dos estudantes. Na economia esta questão é simples: com muitos clientes mantem-se alto os preços, inclusive o nível do professorado, com menos clientes diminuem-se os preços e o nível de formação dos docentes. Na educação a lógica é a do entra qualquer um, mas não vão sair todos aqueles que entraram. E não saem não é porque não suportam a qualificação dos docentes ou o saber organizacional, é porque simplesmente não dão conta de pagar ou usaram do poder da clientela de buscar produtos sempre mais baratos e fáceis de achar no mercado.
.
De qualquer forma, na caixa de pandora que se transformou a educação superior no Brasil, o docente se vê em uma encruzilhada tensa e perigosa. De um lado, muitos e muitos alunos, salas ainda lotadas e heterogêneas nas quais não se tem sequer o tempo de saber o nome e a historia do estudante. A educação é em massa e certamente Henry Ford ficaria feliz em ralação a isso. De outro lado, aparece a figura fantástica e fantasmagórica desse sujeito taylorista, capitão do mato e capataz encontrado no meio dos próprios professores que - pelo menos na teoria - sofrem os mesmos constrangimentos. E a violência daqueles que nos é igual é sempre pior, pois eles sabem dos jogos, relações e mecanismos da profissão. Não creio que a presente situação vai mudar tão cedo. Muito pelo contrário, as relações estão ficando mais tensas e uma espécie de violência simbólica, de uma educação superior paranoica tem se forjado porque o docente, encarcerado no meio do mudo é como cego em meio a tiroteio. Vai ele tomar bala para todo lado, algumas perdidas outras encontradas. Ele vai cair e como bêbado vai se levantar e continuar a buscar novos muros. Tudo termina quando no coração covardemente é cravada uma faca e sem forças ele cai deixando-nos surpreendidos e na espera da próxima vítima.
.
* é professor e sociólogo. Organizador dos livros, “Polícia em Movimento”. Belo Horizonte: Ed. ASPRA, 2006 e “Mulher, política e sociedade”. Brumadinho, MG: Ed. ASA, 2009.

sábado, 23 de julho de 2011

Educação

Aluno que matou professor do Izabela Hendrix é absolvido e será internado

DA REDAÇÃO - 22/07/2011

O estudante de 24 anos que é acusado de esfaquear e matar um professor do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, em dezembro de 2010, foi absolvido. A decisão é do juiz presidente do II Tribunal do Júri do Fórum Lafayette, Glauco Eduardo Soares Fernandes, em substituição ao juiz sumariante. Além de ser absolvido, o estudante será internado pelo período mínimo de três anos, já que foi comprovado que ele sofre de esquizofrenia. Com base no laudo de sanidade mental do acusado, o magistrado entendeu que o estudante era inimputável, ou seja, não poderia ser responsabilizado pelo crime. O Ministério Público (MP) também pediu a absolvição do réu e a internação nos termos do artigo 96 do Código Penal Brasileiro.

Durante a realização da audiência, foram ouvidas quatro testemunhas. Em seguida o réu foi interrogado. Em depoimento bastante confuso, ele assumiu a autoria do crime, justificando sua conduta por se sentir perseguido e humilhado pela vítima dentro da sala de aula. Após o depoimento do acusado, as partes fizeram suas alegações finais orais. MP e defesa entenderam que o estudante deveria ser absolvido, tendo em vista o laudo psiquiátrico que comprova ser o réu portador de transtornos mentais que o tornam inimputável. Assim, ambos pediram que fosse aplicada ao acusado a medida de segurança na forma legal.

O juiz analisou o laudo pericial que informa ser a esquizofrenia “doença que tolhe a capacidade de entender o caráter ilícito de seus atos”. Assim, de acordo com o julgador, “a culpabilidade do agente não se encontra presente”. O magistrado argumentou ainda, também com base na perícia realizada, que o acusado parecia sofrer de delírios que teriam conexão com os fatos em questão. Glauco Fernandes determinou que, transitada em julgada a decisão, momento que não cabem mais recursos, as devidas providências devem ser tomadas para internação do estudante em hospital ou estabelecimento psiquiátrico adequado, bem como conversão da prisão preventiva na medida de segurança imposta.

O estudante estava recolhido no presídio Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Belo Horizonte. Segundo a denúncia, minutos antes do início das aulas, o estudante teria esfaqueado o professor no peito, causando sua morte. Para a promotoria, “o crime foi cometido por motivo fútil e mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima”.

COM INFORMAÇÕES DO TJMG

Fonte: Jornal O Tempo (BH)

Entre professores, prostitutas e policiais



Lúcio Alves de Barros*
.
Fiquei pensando sobre as profissões iniciadas com a letra “P”. O conjunto de letras a seguir, que utilizo nesta crônica, não deve ser lido por todos, principalmente pelos mais afetados ou que operam no campo da discriminação. Esta crônica é o resultado de pensamentos que invadiram minha mente na viagem em ônibus coletivo. E na retina e depois na mente apareceram as profissões iniciadas com “P”, como os professores, os policiais, padeiros, pescadores, padres, pastores, psicólogos, profissionais do sexo, etc. Percebi que eram várias e escolhi três que possuíssem muitas coisas em comum. É claro que as outras podem também partilhar de muitas das características que descreverei, mas me interesso pelos professores, as profissionais que lidam com o sexo e os policiais, notadamente, os policiais militares.

Não vou discutir, por falta de espaço e tempo, o que cada profissão faz ou anda fazendo. Creio que o importante é destacar o que as três têm em comum ou revelar o que apenas uma profissão é capaz de levar a efeito.

Em tempos de greve de professores da rede estadual e conflitos com os policiais militares cabe lembrar que tanto professores, policiais e profissionais do sexo, podem se constituir como alvos fáceis da “força armada do estado”. Explico melhor; professores, policiais e prostitutas, quando não andam na linha, são fortemente reprimidos pelos policiais. O papel do policial neste caso chega a ser embaraçoso, pois mesmo o colega de trabalho pode ser vítima da repressão tal como aconteceu em Minas Gerais nos anos de 1997 e 2004. Policiais também tem forte relação com as profissionais do sexo. Para se ter uma ideia basta perguntar a uma prostituta do que mais ela tem medo e certamente um dos receios será o policial que teima em “vigiar” e reprimir uma prática legal e que não deixa de atender ao público, tal como os professores e também os próprios policiais.

O que parece ser monopólio da polícia é o uso legítimo da violência baseado em preceitos legais. O leitor pode argumentar que a violência também é produzida por professores e pelas putas. Concordo, mas somente a polícia abre a possibilidade de ser chamada para a solução das desavenças que saem do controle civilizacional e somente ela pode e deve agir no que toca à manutenção da paz e da ordem pública. A questão é de matéria constitucional e o problema reside na legitimidade da violência, uma relação complicada e de difícil mensuração que nos tempos hodiernos tem recebido o nome de “força física comedida”.

Quanto aos professores, além da histórica relação conflituosa com o Estado em relação às condições de trabalho e a precariedade salarial, é mais do que notório o seu conteúdo interativo. Professores lidam com o outro, por definição estranho, diferente e complexo. Um outro repleto de metamorfoses, haja vista que os estudantes parecem não envelhecer e a cada ano os docentes são surpreendidos com novos outros em salas heterogêneas, lotadas, desorganizadas e - na maioria das vezes - com cabeças despreparadas e sem o mínimo de condições de estarem naquele local. Docentes, tal como as profissionais do sexo e policiais, em geral recebem mal. É óbvio que sei daqueles que possuem bons salários e estão felizes nas condições nas quais se encontram. Mas, tal como na década de 80, as greves continuam e tenho sérias dúvidas se de lá para cá a situação da educação não passou de uma crise ao caos aberto e tão banalizado que as pessoas não desejam sequer enxergar. A vida de professor, tal como as das outras duas profissões já mencionadas não é fácil. Os docentes, e digo daqueles em situação crítica, andam pulando de um lugar ao outro para aumentar os rendimentos. No passado, ou mesmo no presente, policiais fazem bicos pelo mesmo motivo e as profissionais do sexo há tempos já têm variado as posições e as possibilidades de emprego no intuito de também aumentarem a renda.

A questão é clara e estamos falando de uma profissão que carrega o serviço para casa. Chega mesmo a ter no contracheque as horas que deve deixar de viver em razão da preparação das aulas e do andamento do trabalho durante o semestre. A condição é tão interessante que a marca “professor”, tal como uma cicatriz, persegue o profissional. Os mais românticos vão entender isso como configuração de identidades. Compreendo como mais trabalho e exposição à interação porque, definitivamente, é cansativo e carregar o estigma de professor nos dias de hoje é, por mais que seja hilário, receber uma visão de “coitado”, “mendigo do ensino”, “salvador” e “sofredor”. Para ser mais polido com as palavras, dificilmente vamos encontrar outra profissão tão desvalorizada quanto a de professor. A precariedade, a proletarização, a desprofissionalização da categoria são sinais claros desse desvalor. Tal como disse um aluno: “qualquer um pode ser professor hoje”. E este aluno está certo, qualquer um pode ser um docente, mas também policial ou profissional do sexo. Sei que não é qualquer um que pode ser oficial, professor das “melhores” universidades ou profissionais de luxo no campo do prazer. Mas “o qualquer um” neste contexto traz a ideia do desencanto, da desistência, da desvalorização e do desrespeito. Curioso tais condições fazerem parte de uma profissão interativa, a qual lida com infantes, adolescentes e a juventude em formação. Desconheço seres humanos que não passaram por tais condições.

No que diz respeito às profissionais do sexo, um bom eufemismo para os “politicamente corretos”, é mais do que vexatórias, humilhantes e inacreditáveis as condições de trabalho. Tal como os professores e os policiais elas também carregam um complexo estigma, mas diferentemente deles, elas se escondem em “nomes de guerra”. Fato também conhecido entre policiais, mas em desuso em tempos de democracia. Na discrição, as profissionais do sexo vendem o corpo em “locais de tolerância” ou fazem uso ostensivo do telefone e de anúncios que receberam uma nova roupagem no mundo virtual. Professores buscam emprego de outra forma e policiais fazem concurso. Somente as profissionais do sexo se vendem em pelo e categoricamente por dinheiro. Basta entrar na internet ou parar em frente das bancas de jornal e telefonar para ver o preço da labuta. Professores ainda lecionam de graça pela causa e pelo sacerdócio histórico que atravessa a profissão, mas também oferecem suas habilidades em troca de dinheiro. O fato é que somente a profissional do sexo vende por dinheiro o sexo em favor do prazer sexual do outro.

Como se vê, as profissões escolhidas com “P” tem algumas coisas em comum. Talvez tenham mais diferenças. Não importa. À guisa de conclusão, cumpre apontar para duas questões: em primeiro que o poder da profissão não reside em sua história, na qualificação ou nas possibilidades abertas no mercado de trabalho. O seu poder está na capacidade de luta, mobilização de atores interessados e associação com políticas de governo. O segundo ponto, associado ao primeiro, é o valor trabalho, que segue a mesma lógica de raciocínio: quanto maior o poder, maior o salário, os direitos, os privilégios. No caso em tela, professores e profissionais do sexo saem perdendo. A educação não é uma política de governo e a prostituição ainda não recebeu a devida regulamentação. Quanto aos policiais militares, a despeito dos problemas salariais que a categoria vem enfrentando no cenário nacional, é mais do que óbvio que a luta no campo da política colocou na agenda dos donos do poder a “segurança pública” como “problema de polícia”. Neste sentido, a ideia de segurança recebeu novas roupagens e, diferentemente dos professores e das prostitutas - pelo menos em MG -, os policiais têm recebido os maiores e melhores holofotes do Estado. Com grande poder de mobilização e capilaridade territorial (professores e profissionais do sexo compartilham do mesmo fenômeno) e ainda por cima armados a categoria pode fazer valer o “manda quem pode” e o “obedece quem tem juízo”.

* é professor e sociólogo. Organizador dos livros, “Polícia em Movimento”. Belo Horizonte: Ed. ASPRA, 2006 e “Mulher, política e sociedade”. Brumadinho, MG: Ed. ASA, 2009.

Texto pubçicado no Recanto das Letras - Código do texto: T3105885

Educação e política

sexta-feira, 22 de julho de 2011

As Casas


Gaston Bachelard (1884-1962)

Salomão Ferreira de Souza*
.
Quantos milhões de anos a terra fermentou seus líquidos para destilar a primeira vida? A precisão científica ainda não conseguiu dizer, mas posso imaginar que esse macerar durou muito mais que a própria existência de Géia*, pois antes mesmo de nosso planeta tomar essa conformação, os fenômenos já fermentavam elementos para este e outros fins ignorados. É do lugar onde moramos, juntamente com inumeráveis hóspedes, que pretendo dizer das casas: uma que denominamos planeta Terra e outras que foram surgindo aos poucos ao longo das eras.

A primeira casa, generosa, portas e janelas abertas, em cujos salões seus moradores interagem, se entendem, devoram ou fazem guerras. Outras que a vida, para se proteger dos fenômenos, fincou na epiderme do planeta, nas lamas dos oceanos, lagos e rios, nos picos das montanhas, nos apêndices e interior de outros corpos. Uma última, mais complexa, de duas dimensões: a primeira interna, de paredes invisíveis, cuja estrutura é subjetiva; outra externa, concreta, porém diferente das casas forjadas na relação da vida com os fenômenos, posto que, uma vez impregnada com os signos culturais humanos, se reveste de múltiplos significados.

Como construtor dessa última modalidade de casa, pretendo falar um pouco mais sobre ela e suas dimensões, buscando esclarecer os significados culturais que lhes damos com vistas a entender melhor as diferenças entre o animal humano e o animal natural.

Primeiramente falo da dimensão interna, aquela que Bachelard (1993) divide em três espaços: o porão, os salões e o sótão. É essa dimensão psicológica e implícita da casa que esconde ou desvela, prende ou libera nosso mobiliário ao olhar do outro. Abrimos seus salões aos visitantes, quando buscamos projetar nossa imagem no ponto central das atenções dos outros; escondemos no sótão as coisas que só podem ser confiadas aos mais íntimos; nos porões velamos aquelas que tememos que o outro veja, mesmo na intimidade. Essas últimas, de tão obscuras, evitamos contemplar. Por isso as encerramos no mais secreto da casa, um lugar sem janelas nem iluminação, para que fiquem bem seguras e distantes da vista daqueles que visitam nossos salões ou que, na intimidade, tem acesso aos segredos do sótão. Transformamos essa casa interna – principalmente os porões – numa fortaleza e, como em Clarisse (1999), “trancamos as portas, deixando de fora tudo que nos ameaça”. Esquecemos que é dentro dela que habita não só a vida, mas também a morte, os medos, os demônios que nos atormentam. É aí também que nos encontramos presos ou nos sentimos libertos. É sobre a proteção dessa casa interior que reproduzimos nossos leões e cordeiros.

Uma vez sabedores da obscuridade desses espaços, escondemos, tão bem, nossas mobílias e ferramentas de guerra. Elas ameaçam integridade dos seus e, muito mais, daqueles que a visitam, aos quais, apesar do disfarce, desejamos que morram ou se danem, pois quase sempre, concorrem ao reflexo dos espelhos, onde acreditamos projetar, absolutos, nossa imagem narcísica. O outro furta os desejos mais íntimos do dono da casa; são obstáculos nos caminhos de mediações inaceitáveis, alem de potenciais concorrentes ao posto de poder que julgamos nosso. Se o outro é, enquanto nosso concorrente, um elemento indesejado, repulsivo ou apenas indiferente, por outra via é nosso querido convidado, de quem esperamos seja testemunho da condição de poder que julgamos detentores.

A outra dimensão da casa, a externa e concreta, também ganha, pela cultura, outros tantos significados, diferentes aqueles originalmente determinados. Edificada naturalmente para abrigar o animal humano, a casa tornou-se cultural ao ganhar a dimensão de poder, estilo de vida, lugar de memórias, crenças e expressões da arte. Uma das nuances da casa externa é a de que, embora possa nos pertencer por imposição das convenções reguladoras, quem a fabrica não são, por princípio, seus moradores. Nisso ela diferencia muito das casas dos animais naturais. Outro fator de distinção são os espaços bem delimitados e que servem, principalmente, para conter seus habitantes colocando-os em seus devidos lugares. Aí, além de representar, pela exuberância ou não, uma condição primordial de exercício de poder, internamente, ao reter seus membros em compartimentos delimitados, exerce um poder que não é visível do lado de fora e, muitas vezes, nem por aqueles que dividem seus espaços.

Essa dupla dimensão de poder que a casa externa exerce na cultura humana é a que faz com que os espaços urbanos sejam determinados por uma disposição de construções indicativas, no geral, das condições econômicas, históricas e sociais de seus habitantes, alem de conter um poder oculto na divisão geográfica das cidades e dos territórios terrestres.

Vejam as mansões de classe alta, com seus imensos espaços vazios, fachadas e jardins, entregues aos cuidados dos empregados, ou simplesmente guardadas pelos cães e aparatos eletrônicos. Apresentam-se como verdadeiras fortalezas garantindo o isolamento do outro, na e pela distância de seus amplos espaços. Guardam em silêncio e na obscuridade de seus porões, os mecanismos que forjaram as riquezas que as ostentam.

Reparem o contraste entre aquelas edificações e os barracos dos aglomerados: nesses os espaços são insuficientes para abrigar todos os seus habitantes. Aqui animais são relegados ao espaço público pela impossibilidade de dividir ainda mais o exíguo território das moradias. Enquanto aqui, cães soltos nas vias públicas acompanham qualquer andante, lá eles ladram pedestres distantes, tentando espantar a solidão de vastos e luxuosos canis ou, como seus donos, buscando impor uma autoridade simbólica que só existe na estrutura fria dos pilares daquelas mansões. Esquecemos a verdadeira dimensão daquilo que nos abriga e por isso, como nos salões da casa interna, voltamos ao espelho para projetar, não somente a imagem de nossas flácidas caras, mas uma, emprestada pelas construções concretas, que acreditamos ser, para além de nosso poder imediato, a própria imortalidade de seus donos e idealizadores. Esquecemos que os homens morrem, as casas caem e sobre seus escombros outras casas vão sendo construídas, apagando a memória de antigos moradores. Só a terra persiste com sua superfície levemente enrugada, mas pronta para regenerar-se e abrir espaços para outras possibilidades de moradas e moradores futuros. Que certeza temos das possibilidades de nossa primeira casa?

(*) Na mitologia grega Géia é a Terra primitiva, que surge depois de Eros, o desejo. Esse desejo de existir, de se fazer matéria e que atribuo, livremente, ao princípio de confinamento das energias, tão essencial aos arranjos e rearranjos do universo.

BIBLIOGRAFIA

BACHELARD, Gaston. A Poética do Espaço. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
LISPECTOR, Clarice. Para não Esquecer. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
.
* Salomão Ferreira de Souza é escritor em Belo Horioznte

quarta-feira, 20 de julho de 2011

O piso salarial dos professores


Sind-UTE/MG protocola mais de 1.700 ações no Tribunal de Justiça cobrando o pagamento do piso salarial

PRISCILA COLEN

Os trabalhadores da educação, coordenados pelo Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (Sind-UTE/MG), já ajuizaram 1.723 ações junto ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), cobrando o pagamento do Piso Salarial Profissional Nacional (PSPN). Segundo informou o Sind-UTE, as ações estão sendo protocoladas sistematicamente.

O objetivo é questionar, juridicamente, o Governo de Minas Gerais. Atualmente, o piso em Minas é de R$ 369, valor que, de acordo com pesquisa da Confederação Nacional dos Trabalhadores, é o pior entre os 27 estados brasileiros. O sindicato cobra o valor de R$ 1597 para uma jornada de 24 horas, valor do piso segundo a lei de número 11.738. Os trabalhadores já estão em greve desde 8 de junho. A interrupção das atividades é uma resposta ao Governo do Estado que oferece péssimas condições de trabalho ao funcionalismo público. Uma nova assembleia será realizada em 03 de agosto para decidir os rumos do movimento.

Fonte: O Tempo (MG)

Economista defende investimento em Educação


Para o economista Alexandre Rands, investir na Educação é a saída para diminuir a desigualdade entre as regiões brasileiras. No XVII Fórum BNB de Desenvolvimento são estudadas alternativas para diminuir as desigualdades e erradicar a pobreza na região Nordeste. Capacitar professores e melhorar o ensino são algumas das principais soluções para alcançar o equilíbrio entre as regiões brasileiras

Investir na Educação é a saída para diminuir a desigualdade entre as regiões brasileiras. Para o economista Alexandre Rands, o crescimento do Brasil é visível, mas se o Nordeste continuar no mesmo ritmo que o resto do país, nunca conseguirá diminuir a desigualdade. É preciso crescer e investir ainda mais, especialmente em Educação, para conseguir o equilíbrio entre as regiões.

Criar subsídios ou investimentos de infraestrutura “não arranha nem a casca do problema da desigualdade”, diz Alexandre. É preciso compensar na Educação, qualificando professores. Para ele, a desigualdade regional não acontece entre mercados de mão de obra, mas pela diferença de formação profissional e Educação.

Ceará: Entre os estados do nordeste, o Ceará é um dos poucos com cultura para crescimento. As classes média e alta são muito dinâmicas, assim como o mercado cearense. Resolvendo a questão da Educação e da disciplina do trabalho, o Ceará passa a ser o primeiro da região. Em seu livro lançado ontem no encontro da Associação Nacional dos Centros de Pós-graduação em Economia (Anpec) realizado em Fortaleza, “Desigualdades Regionais no Brasil: Natureza, Causas, Origens e Solução”, Alexandre explica que a origem da desigualdade não é advinda do processo de industrialização, como dizia Celso Furtado. A vinda da corte portuguesa ao Brasil consolidou um centro de pessoas qualificadas na região sul do país. E pode ser mais bem percebida depois do ciclo de ouro.

A classe média tem papel fundamental no desenvolvimento. Ela aumenta a demanda e o mercado. Além de aumentar a escala para a Educação, baixando o custo do aluno. Alexandre explica que uma sala com dez alunos tem quase o mesmo gasto de uma sala com 30. O economista diz também que “não adianta criar subsídios para a microempresa. O problema vem com as políticas demandadas pela elite do Nordeste”, em que a Educaçãonão era foco. Eliminar a desigualdade no investimento em Educação e criar um sistema para qualificar o professor são alternativas propostas pelo economista para colocar a Educação em primeiro plano. “No nordeste, um estudante recebe nem metade dos gastos que um estudante em São Paulo”, diz. Para o sistema de incentivo, Alexandre aconselha a política de promoção da eficiência, em que o professor recebe bônus ao alcançar metas estabelecidas.

ENTENDA A NOTÍCIA - O encontro nacional da Anpec faz parte do XVII Fórum BNB de Desenvolvimento. No evento, foi lançado o livro do economista Alexandre Rands sobre desigualdades regionais no Brasil, com foco no Nordeste. No livro, o autor aponta a Educação como solução para muitos dos problemas da região.

SAIBA MAIS - Desigualdades - O livro do economista Alexandre Rands, Desigualdades Regionais no Brasil: Natureza, Causas, Origens e Solução (editora Elsevier, 350 páginas) é o mais novo estudo que trata da questão regional no Brasil.

A obra traz uma análise histórica, social e atual da desigualdade regional, pontuando os vários aspetos que compõem a questão das desigualdades entre as regiões brasileiras, com foco no Nordeste. Alexandre estuda o tema há quase sete anos e o livro demorou quase dois anos para ser escrito.

Fonte: O Povo (CE)

Da intolerância

terça-feira, 19 de julho de 2011

Roubo contra crianças e doentes


Educação e Saúde respondem por até 70% dos desvios de verba pública, aponta AGU

Irregularidades em reformas de escolas e hospitais, verba de merenda, construção de quadra esportiva, compra de medicamentos, procedimentos do SUS, entre outros, estão entre os principais ralos dos desfalques dados no Erário. O levantamento é do Departamento de Patrimônio e Probidade da Advocacia Geral da União (AGU). O foco da corrupção está nos repasses de valores geralmente inferiores a R$100 mil, mais difíceis de serem identificados e, portanto, menos detectados pela fiscalização. No caso da Saúde, estão incluídas também obras de saneamento. Para o diretor do Departamento de Patrimônio e Probidade da AGU, André Luiz de Almeida Mendonça, as obras menores dão mais trabalho para fiscalizar e evitar o dano:

- Quando você trata de uma grande obra, naturalmente várias pessoas estão em torno dela. Quando você pulveriza o dinheiro público, dificulta a fiscalização e a percepção de que tem que fiscalizar. Nas pequenas obras e nos pequenos repasses é que encontramos o maior fluxo de casos de desvios.

Um fator que contribui para os desvios nos ministérios da Saúde e da Educação é o tamanho do orçamento das duas pastas. Os dois têm mais recursos que qualquer outro ministério (com exceção da Previdência, que incorpora os gastos com custeio no pagamento aos aposentados). No Orçamento de 2011, são R$77,15 bilhões para a Saúde e R$63,71 bilhões para a Educação.

"O SUS virou balcão de negócios"

Para Francisco Batista Jr., ex-presidente do Conselho Nacional de Saúde, o grande problema é o SUS: - O SUS hoje virou um grande balcão de negócios com o setor privado do país. Está sem controle.

Na Educação, Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, diz que é comum o uso de recursos da área para pagar folha de outros setores. Além disso, segundo ele, é comum a contratação de empresas privadas para fornecer serviços que já são prestados pelo poder público.

- Outro problema corrente, bastante grave, é a contratação de serviços de empresas privadas que não deveriam ser contratados. Isso porque as necessidades já são supridas por programas nacionais, caso dos livros didáticos - diz Cara.

André Mendonça diz não ser possível apontar exatamente onde, nos serviços de Saúde, ocorrem mais desvios. Isso porque o volume de recursos para o sistema é muito alto e com várias divisões. Há casos, diz ele, em que médicos atendem pelo SUS e, ainda assim, cobram por fora do paciente, embolsando duas vezes. Mendonça diz ainda que a fiscalização na Educação é mais falha que na Saúde. Em março, O GLOBO revelou que só 5% do dinheiro repassado pelas chamadas transferências fundo a fundo - diretamente aos cofres de estados e prefeituras - caem na rede do controle, pelo programa de sorteio de municípios da Controladoria Geral da União (CGU).

Apenas as tomadas de contas concluídas entre 2007 e 2010 somavam desvios apurados de R$662,2 milhões nas duas áreas. Faltam mecanismos para verificar como o dinheiro federal foi gasto em estados e municípios. O Ministério da Saúde não consegue checar a veracidade dos relatórios dessa prestação de contas. Outro problema é a falta de autonomia dos conselhos municipais de Saúde e Educação para fiscalizar as prefeituras. Relatório da CGU apontou que metade dos conselhos está desestruturada ou não funciona adequadamente.

Há menos de um mês, a presidente Dilma Rousseff fez um decreto para tentar frear as irregularidades na Saúde e na Educação. O principal mecanismo é a restrição dos saques em dinheiro na boca do caixa, com a garantia de que o dinheiro sairá das contas dos fundos municipais e estaduais de Saúde e Educação diretamente para a conta do prestador do serviço ou do fornecedor. Essas medidas foram tomadas após recomendações de CGU, TCU e Ministério Público.

COLABORARAM: Joelma Pereira e Roberto Maltchik

Fonte: O Globo (RJ)

segunda-feira, 18 de julho de 2011

O “complexo Deus” da modernidade

Leonardo Boff*


A crise atual não é apenas de escassez crescente de recursos e de serviços naturais. É fundamentalmente a crise de um tipo de civilização que colocou o ser humano como “senhor e dono” da natureza (Descartes). Esta, para ele, é sem espírito e sem propósito, e por isso pode fazer com ela o que quiser.

Segundo o fundador do paradigma moderno da tecnociência, Francis Bacon, cabe ao ser humano torturá-la, como o fazem os esbirros da Inquisição, até que ela entregue todos os seus segredos. Desta atitude se derivou uma relação de agressão e de verdadeira guerra contra a natureza selvagem que devia ser dominada e “civilizada”. Surgiu também a projeção arrogante do ser humano como o “Deus” que tudo domina e organiza . Devemos reconhecer que o cristianismo ajudou a legitimar e a reforçar esta compreensão. O Gênesis diz claramente: “Enchei a Terra e sujeitai-a e dominai sobre tudo o que vive e se move sobre ela” (1,28). Depois se afirma que o ser humano foi feito “à imagem e semelhança de Deus” (Gn 1,26). O sentido bíblico desta expressão é: o ser humano é lugar-tenente de Deus e, como este é o senhor do universo, o ser humano é senhor da Terra. Ele goza de uma dignidade que é só dele, o de estar acima dos demais seres. Daí se gerou o antropocentrismo, uma das causas da crise ecológica. Por fim, o estrito monoteísmo retirou o caráter sagrado de todas as coisas e o concentrou só em Deus. O mundo, não possuindo nada de sagrado, não precisa ser respeitado. Podemos moldá-lo ao nosso bel-prazer. A moderna civilização da tecnociência encheu todos os espaços com seus aparatos e pôde penetrar no coração da matéria, da vida e do universo. Tudo vinha envolto pela aura do “progresso”, uma espécie de resgate do paraíso das delícias, outrora perdido, mas agora reconstruído e oferecido a todos.

Esta visão gloriosa começou a ruir no século 20 com as duas guerras mundiais e outras coloniais, que vitimaram duzentos milhões de pessoas. Quando se perpetrou o maior ato terrorista da história, as bombas atômicas lançadas sobre o Japão pelo Exército norteamericano, que matou milhares de pessoas e devastou a natureza, a humanidade levou um susto do qual não se refez até hoje. Com as armas atômicas, biológicas e químicas construídas depois, nos demos conta de que não precisamos de Deus para concretizar o Apocalipse.

Não somos Deus, e querer ser “Deus” nos leva à loucura. A ideia do homem como “Deus” se transformou num pesadelo. Mas ele se esconde ainda atrás do “tina” (there is no alternative) neoliberal: “Não há alternativa, este mundo é definitivo”. Ridículo. Demo-nos conta de que “o saber como poder” (Bacon), quando feito sem consciência e sem limites éticos, pode nos autodestruir. Que poder temos sobre a natureza? Quem domina um tsunâmi? Quem controla o vulcão chileno Puyehe? Quem freia a fúria das enchentes nas cidades serranas do Rio? Quem impede o efeito letal das partículas atômicas do urânio, do césio e de outras liberadas pelas catástrofes de Chernobyl e de Fukushima? Como disse Heidegger em sua última entrevista ao Der Spiegel: “Só um Deus nos poderá salvar”. Temos que nos aceitar como simples criaturas junto com todas as demais da comunidade de vida. Temos a mesma origem comum: o pó da Terra. Não somos a coroa da criação, mas um elo da corrente da vida, com uma diferença, a de sermos conscientes e com a missão de “guardar e de cuidar do jardim do Eden” (Gn 2,15), quer dizer, de manter a condições de sustentalidade de todos os ecossistemas que compõem a Terra.

Se partimos da Bíblia para legitimar a dominação da Terra, temos que voltar a ela para aprender a respeitá-la e a cuidá-la. A Terra gerou a todos. Deus ordenou: “Que a Terra produza seres vivos, segundo sua espécie” (Gn 1,24). Ela, portanto, não é inerte, é geradora e é mãe. A aliança de Deus não é apenas com os seres humanos. Depois do tsunâmi do dilúvio, Deus refez a aliança “com a nossa descendência e com todos os seres vivos” (Gn 9,10). Sem eles, somos uma família desfalcada.

A história mostra que a arrogância de “ser Deus”, sem nunca poder sê-lo, só nos traz desgraças. Baste-nos ser simples criaturas com a missão de cuidar e respeitar a Mãe Terra.

*Leonardo Boff é teólogo e escritor

Fonte: Jornal do Brasil (on line)

Repressão e educação

Quanto vale um professor?


Por: Antônio Góis*

RIO DE JANEIRO - Greves de professores, como as que ocorrem no Rio e em Minas, costumam seguir no Brasil um triste roteiro. Sem força para mobilizar a categoria, sindicatos têm de apelar para ações mais radicais. Enquanto isso, a vida segue nas escolas, com parte dos professores em greve, outra trabalhando, e os alunos sabendo que a reposição das aulas, ao final, será para inglês ver.

Sem entrar no mérito da viabilidade, a reivindicação salarial é justa. No Brasil, em geral, um professor que concluiu a universidade e dá aula no ensino fundamental tem salário que corresponde apenas à metade dos rendimentos médios de todos os trabalhadores com formação superior. Já foi pior. Em 1995, a proporção era de só um terço.

No debate sobre salários, dois grupos se enfrentam: os que defendem reajustes iguais para todos e aqueles que querem remuneração por mérito, vinculando ao menos parte do pagamento ao desempenho docente. Curioso é notar que políticas tão opostas têm resultados semelhantes. Já se sabia, a partir de vários estudos, que salário não tem relação imediata com desempenho do aluno. Agora, surgem evidências de que a bonificação por mérito tampouco tem efeito. Foi esta a conclusão de um relatório publicado no mês passado pela Associação de Escritores em Educação dos EUA, após revisão de estudos publicados naquele país.

Mas tais estudos captam apenas efeitos imediatos. No longo prazo, a perda de prestígio deixa a carreira pouco atrativa para os talentos que poderiam estar em sala de aula, mas optam por outras profissões. É por isso que são fundamentais políticas de Estado como o Plano Nacional de Educação, em discussão no Congresso. Sem metas e exigências mínimas de investimento no setor, é sempre tentador para o político colocar trens-balas e afins à frente da educação.

* Antônio Góis é jornalista e trabalha na sucursal carioca do jornal Folha de S. Paulo

Fonte: Folha de São Paulo (SP)

sábado, 16 de julho de 2011

GREVE: o tempo e o vento

Pela nossa dignidade, continuamos em greve


Por Luana Santos*

Quem acompanha com freqüência o Viomundo deve ter visto os vários posts sobre a greve dos profissionais da educação de Minas Gerais, que hoje completa 36 dias. Até o momento, além de Minas, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte permanecem em greve.

Como já foi dito pelos meus colegas que aqui deixaram seus escritos, a situação dos professores mineiros não difere muito da denunciada em vídeo pela professora potiguar Amanda Gurgel no mês de maio. Além dos baixos salários, convivemos com jornadas extenuantes, condições precárias de trabalho e o que pouca gente sabe, é que a cada dia aumenta o número de trabalhadores afastados das salas de aula por problemas emocionais e psicológicos.

Na terça-feira a greve ganhou um novo capítulo. Não sei se para ser lembrado ou esquecido. Um grupo de professores ao ser impedido de realizar uma assembléia nas dependências da Cidade Administrativa, sede do governo estadual, fechou a Linha Verde, via de acesso ao aeroporto Tancredo Neves (em Minas, os Neves estão por todos os lados, assim como os Magalhães na Bahia e os Sarney no Maranhão). O que se viu foi o quanto os resquícios da ditadura permanecem vivos por essas bandas. A Tropa de Choque agrediu os professores com cassetetes e usou gás de pimenta para dispersar os manifestantes. Não é necessário dizer muita coisa, as imagens falam por mim:

No dia seguinte, como tem acontecido desde o início do movimento, cerca de 5 mil professores reuniram-se no pátio da Assembléia Legislativa. Antes de me juntar aos companheiros de profissão, caminhei pelos corredores da Casa. Em um dos gabinetes, duas mulheres conversavam animadamente, enquanto um rapaz debruçado sobre uma mesa dormia um sono profundo. Realmente alguns escritores são atemporais. Tive a sensação de estar diante das repartições públicas narradas por Lima Barreto e Graciliano Ramos durante as primeiras décadas da República. Em seguida, caminhei até o refeitório. Sentei próxima a um grupo de professoras. Deduzi que elas vinham de longe, pois traziam o almoço em marmitas. Descobri que eram de Ituiutaba, cidade que fica a 700 km de Belo Horizonte. Perguntei o que as levaram viajar quase 12 horas de ônibus somente para participar da manifestação. Recebi uma resposta sem meias palavras: “Luto pela minha dignidade”. Diante de tantas indagações uma delas perguntou em qual jornal eu trabalhava. Achei graça. Expliquei que a imprensa mineira dificilmente noticia qualquer coisa que arranhe a imagem do governo tucano. Por aqui são muitos os fantasmas dos anos de chumbo a nos perserguir.

Deixei as dependências da Assembléia e no meio da multidão encontrei uma amiga dos tempos da faculdade. Recebi notícias de algumas pessoas que formaram conosco. Joana montou uma loja de bijouterias, Ana trabalha em uma empresa de equipamentos de segurança, Adriana vende produtos de informática e André atua na área de consultoria. No frigir dos ovos, apenas 5 ou 6 lecionam. Está explicado o motivo do esvaziamento dos cursos de Licenciatura. É muito difícil permanecer numa profissão cujo piso salarial básico é de R$ 550,00.

As pessoas costumam dizer que o mineiro “come queto”, é receptivo e desconfiado. Acrescento que também somos criativos. Em um dos cartazes de protesto, a sigla do PSDB ganhou um acróstico – Pior Salário Do Brasil. Em outro, Anastasia é “Procurado”. Desde que os setores da educação, da saúde e da segurança entraram em greve, tornou-se muito difícil ter notícias do governador. Morto ele não está. Apareceu no velório de Itamar ao lado de Aécio e Serra. Vez por outra inaugura uma obra nas cidades do interior. O afilhado de Aécio não faz outra coisa além de preparar o terreno para o p adrinho. E olhem que ainda faltam 3 anos para 2014. A noite de ontem foi longa. Eram 2 da manhã desta quinta-feira, 14 de julho, e ainda havia professores reunidos no plenário da Assembléia Legislativa. O objetivo era obstruir a pauta dos deputados e com isso impedir o recesso parlamentar. Missão cumprida! Durante esses 36 dias de paralisação, Anastasia e sua base de apoio foram omissos às nossas reivindicações.

Com a desenvoltura de um ator de novela das 8, nosso governador usou a televisão, o rádio e os jornais para tentar desmoralizar um movimento que é legítimo. Em momento algum, Anastasia sinalizou que irá cumprir o que nos é de direito: o pagamento do piso nacional determinado pelo Governo Federal que é de R$ 1.187,97. O valor é praticamente o dobro do que é pago atualmente. Continuam insistindo na política mentirosa de subsídios. Exigimos também a criação de um plano de carreira que valorize a nossa profissão.

Em resposta ao total descaso do governo com a educação, decidimos permanecer em greve por tempo indeterminado. Como disse a professora de Ituiutaba, lutamos pela nossa dignidade.

* Luana Diana dos Santos é cronista, historiadora e professora da Rede Estadual de Educação de Minas Gerais.

Indicação de Leitura


Memórias

Gregório Bezerra

Mais de trinta anos após a publicação das Memórias (1979), de Gregório Bezerra, o lendário ícone da resistência à ditadura militar é homenageado com o lançamento de sua autobiografia pela Boitempo Editorial, acrescida de fotografias e textos inéditos, e em um único volume. O livro conta com a contribuição decisiva de Jurandir Bezerra, filho de Gregório, que conservou a memória de seu pai; da historiadora Anita Prestes, filha de Olga Benário e Luiz Carlos Prestes, que assina a apresentação da nova edição; de Ferreira Gullar na quarta capa; e de Roberto Arrais no texto de orelha. Há também a inclusão de depoimentos de Oscar Niemeyer, Ziraldo, da adovogada Mércia Albuquerque e do governador de Pernambuco (e neto de Miguel Arrais) Eduardo Campos, entre muitos outros.

Em Memórias, o líder comunista repassa sua impressionante trajetória de vida e resgata um período rico da história política brasileira. O depoimento abrange o período entre seu nascimento (1900) até a libertação da prisão em troca do embaixador americano sequestrado, em 1969, e termina com sua chegada à União Soviética, onde permaneceria até a Anistia, em 1979. No exílio começou a escrever sua autobiografia. Nascido em Panelas, no Agreste pernambucano, a 180 km de Recife, Gregório era filho de camponeses pobres, que perdeu ainda na infância, e com cinco anos de idade já trabalhava com a enxada na lavoura de cana-de-açúcar. Analfabeto até os 25 anos de idade e militante desde as primeiras movimentações de trabalhadores influenciados pela Revolução Russa de 1917, Bezerra teve papel de destaque em importantes momentos políticos da esquerda brasileira, e por conta disso totalizou 23 anos de cárcere em diversos presídios e épocas. Foi deputado federal (o mais votado em 1946) pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), ferrenho combatente do regime militar, e por essa razão protagonizou uma das cenas mais brutais da recém-instalada ditadura pós-golpe de 1964: capturado, foi arrastado por seus algozes pelas ruas do Recife, com as imagens tendo sido veiculadas pela TV no então Repórter Esso. A selvageria causou tamanha comoção que os registros da tortura jamais foram encontrados nos arquivos do exército.

Apesar da dura realidade, Gregório jamais cultivou o ódio ou o rancor. Era por todos considerado um homem doce, generoso. Não foi um homem de letras, mas um grande observador e um brilhante contador de histórias. Assim é que suas páginas são narradas, sem afetações ou hipocrisia, passando pelo interior da mata e do agreste nos tempos de estiagem e seca, pelo Recife, o exílio na União Soviética, a militância no PCB. Dizia ele: “Não luto contra pessoas, luto contra o sistema que explora e esmaga a maioria do povo”. Em 1983, o Brasil perdeu este que foi um de seus grandes defensores. Para sorte dos que estavam por vir, porém, ele deixou suas memórias recheadas de verdades e esperanças e que, acima de tudo, representam a história de muitos outros “Gregórios” que transformaram o seu destino na luta para transformar a realidade instituída.
***
Ficha técnica

Título: Memórias
Autor: Gregório Bezerra
Apresentação: Anita Prestes
Orelha: Roberto Arrais
Quarta capa: Ferreira Gullar
Páginas: 648
Preço: R$ 74,00
ISBN: 978-85-7559-160-4
Fonte e enviado pela Editora: Boitempo

terça-feira, 12 de julho de 2011

Em 1.427 escolas do país, diretores dizem já ter visto pessoas armadas; casos recentes mostram que fascínio de jovens por revólveres e pistolas é fatal


Por Leonardo Cazes

RIO - Há exatos dois meses, uma estudante de 14 anos levou uma pistola para dentro do Colégio Estadual Amazor Vieira Borges, em Austin, Nova Iguaçu. A arma (descarregada) foi emprestada por um vizinho, de 18. O episódio não teve maiores consequências, ninguém ficou ferido, mas é assustador por revelar a fragilidade da segurança nos colégios, a facilidade do acesso de adolescentes a armas de fogo e, pior, seu fascínio por elas:

- A estudante alegou que gostava de armas e que queria mostrar a pistola para as amigas do colégio - disse, na época, um policial chamado à escola.

O episódio de Austin não é isolado. Diretores de 1.427 escolas públicas brasileiras relataram ter visto pessoas armadas dentro do colégio, em 2007, segundo levantamento feito pela Megazine a partir das respostas dadas ao questionário aplicado na Prova Brasil daquele ano.

- O que as armas de fogo representam? Força, poder e masculinidade. É um símbolo forte. Meninos e meninas não andam armados para matar alguém, necessariamente. Eles fazem isso para mostrar que estão armados - explica a coordenadora da área de Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, Miriam Abramovay, completando: - Por mais que a intenção seja não usar, tragédias acontecem. Quando fazemos pesquisas, a maioria esmagadora diz que já viu armas de fogo. E diz-se que comprá-las é mais fácil do que comprar pão.

Um caso ocorrido há dez dias numa festa junina, em Botafogo, bairro de classe média carioca, confirma as palavras dela. Rodrigo Paiva Freitas, de 20 anos, atirou em um adolescente de 17 e justificou o crime dizendo que comprou a arma para se defender, após ter apanhado do rapaz - sua futura vítima - e de amigos dele em outra festa. Em maio, a situação também saiu do controle para o adolescente Y., de 17 anos, que assassinou, com quatro tiros, um vizinho de 31 em Pirajá, subúrbio de Salvador. A arma foi comprada por R$ 400, na Feira de São Joaquim, conhecida como "Feira do Rolo".

- Matei porque ele ficava me tirando (paquerando) - "justificou", na época, o assassino.

A promotora Eliane de Lima, da Vara da Infância e Juventude do Rio, explica que o adolescente não precisa de um motivo para portar uma arma:

- O jovem tem a necessidade de se afirmar. Levar uma arma para escola ou para o baile é uma forma de ostentação, mostrar que está com a letalidade nas mãos.

Uma longa lista de estatísticas mostra a dimensão do problema. Na região metropolitana de Belo Horizonte, 5% dos estudantes de escolas públicas e particulares afirmaram já ter levado ou tentado levar armas de fogo para a escola, segundo pesquisa do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG, de 2005. No Distrito Federal, de acordo com estudo de 2008, 20,5% dos alunos, ou 37.921 adolescentes, disseram ter visto alguém armado dentro da colégio. Na região metropolitana de Maceió, 15% das armas apreendidas em 2010 estavam com menores de 11 a 15 anos. No país, 79,5% dos homicídios de jovens foram provocados por armas de fogo. O indicador é do Mapa da Violência de 2011, referente a dados de 2008.

- Se você fizer um levantamento desde 1980, o único segmento da população em que os homicídios cresceram foi na faixa etária entre 15 e 24 anos. Com o aumento da violência, está havendo um extermínio da juventude - resume Julio Jacobo Waiselfisz , autor do mapa.

Enquanto não se acha solução definitiva, campanhas de desarmamento funcionam. Waiselfisz constatou que, em 2004, na grande mobilização pelo desarmamento, o número de homicídios diminuiu no país. Já na campanha lançada em maio passado, 10 mil armas foram entregues. Mas Antônio Rangel, coordenador de desarmamento do Viva Rio, crê que o controle sobre a venda precisa melhorar.

- Temos uma das leis mais restritivas do mundo, mas é tão fácil comprar aqui quanto nos EUA, onde a legislação é liberal. O que falta é fiscalização. Por isso que o Wellington (Menezes Oliveira) conseguiu comprar armas e matar doze crianças - diz Rangel, lembrando o massacre da Escola Tasso da Silveira, em abril, em Realengo.

Localização da escola influencia desempenho do aluno, revela pesquisa


Em unidades situadas em áreas de alta vulnerabilidade social, apenas 10% dos estudantes apresentam desempenho adequado - quando o entorno não é vulnerável, a taxa sobe para 24%
***
Alunos com o mesmo perfil sociocultural têm desempenhos diferentes de acordo com o índice de vulnerabilidade social do local onde fica a escola em que estudam. A conclusão é da pesquisa Educação em Territórios de Alta Vulnerabilidade Social na Metrópole, que avaliou o impacto da localização do colégio na Educação. Em unidades localizadas em áreas altamente vulneráveis, cerca de 50% dos alunos com baixos recursos culturais familiares (bens culturais disponíveis em casa, como TV, DVD, internet e livros, aferidos pelo questionário socioeconômico da Prova Brasil, e escolaridade da mãe ou mulher responsável pelo estudante) têm desempenho abaixo do básico e apenas 10% deles apresentam desempenho adequado.

Já nos colégios de entorno não vulnerável, 38% dos alunos com esse mesmo perfil estão abaixo do básico. A melhora também aparece no aumento de taxa de estudantes com aprendizado adequado e avançado: 24%. A pesquisa conclui que escolas em territórios de maior vulnerabilidade social têm Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) mais baixo que as de entorno menos vulnerável.

Os dados também apontam que alunos com mais recursos culturais apresentam notas mais baixas quando estão matriculados em escolas que ficam em territórios de alta vulnerabilidade social. "Quando mostramos o impacto que o entorno da escola tem na vida do aluno de baixo nível sociocultural, percebemos que ele é, sim, capaz de aprender", explica Mauricio Érnica, coordenador do estudo. A pesquisa é de Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Fundação Tide Setubal, Fundação Itaú Social e Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em 61 escolas públicas de ensino fundamental da subprefeitura de São Miguel Paulista, zona leste de São Paulo. Também foram usadas as notas da 4.ª série do ensino fundamental na Prova Brasil de Língua Portuguesa de 2007 e o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social.

Políticas - A relação entre aprendizado e território se deve a diversos fatores, como o isolamento da escola, a baixa oferta de matrícula na Educação infantil e o nível sociocultural homogêneo dos alunos da região. "Por essas e outras razões, programas públicos tendem a não ter efeito em áreas que demandam políticas sensíveis às desigualdades", diz Antonio Batista, coordenador de desenvolvimento de pesquisas do Cenpec. Ele também destaca que as escolas criam uma relação de interdependência: as unidades localizadas em áreas de vulnerabilidade social média e baixa atraem profissionais mais qualificados e estudantes com melhores recursos culturais familiares. Assim, elas acabam pressionando quem não se adequa a trocar de escola. "Pais que moram em regiões mais vulneráveis evitam certas escolas", diz Batista.

A pesquisa aponta aspectos a serem considerados na formulação de políticas públicas para os territórios vulneráveis. "Temos de pensar em políticas específicas, articuladas com serviços além da Educação; romper o isolamento das escolas, criando mecanismos de colaboração entre elas; e organizar as unidades para atenderem as necessidades de seu público real, não ideal", diz Anna Helena Altenfelder, superintendente do Cenpec. Mozart Neves Ramos, do Movimento Todos Pela Educação, concorda. "Temos um problema multifacetado, que exige a articulação dos governos", diz.

Jovens que estudam em regiões vulneráveis confirmam os problemas apresentados pelo estudo. "Quando mudei para uma escola mais distante daqui, percebi que lá tem mais professores e menos aulas vagas", conta Alex de Araújo, de 16 anos, morador do Grajaú, região sul de São Paulo.

Fonte: O Estado de São Paulo (SP)

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Violência, redescrição e democracia liberal

Por Paulo Ghiraldelli

O Brasil é um país onde em relação a tudo “se dá um jeitinho”. Somos um povo que não leva a vida a ferro e fogo. Verdade? Os dados estatísticos não confirmam tal imagem.Dados recentes do IBGE mostram que passa de 43% o número das mulheres brasileiras que já sofreram agressão doméstica. O Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo, também em indicação recente, revelou que mais de 86% dos professores paulistas já sofreram, da parte de alunos, alguma agressão física ou psicológica dentro do ambiente escolar. Números do movimento gay revelam que, nos últimos tempos, há o registro de mais de 220 mortes de homossexuais por ano, sendo tais mortes ocorridas por conta de as vítimas serem homossexuais – sendo que esse número, por falta de um monitoramento maior, abrangendo todo o Brasil, pode ser o dobro. Pelo senso do IBGE, entre 2002 e 2008 o assassinato de brancos caiu 30% no Brasil, sendo que o de negros, no mesmo período, teve um aumento de 13%.

É claro que essa violência contra grupos específicos é vista pelos setores conservadores como algo que nada revela. Os setores conservadores tendem a dizer que a violência em geral tem aumentado. Eles não mentem. Os dados mostram que o número de assassinatos no Brasil, em vinte anos, cresceu 237%. Por dados da ONU, o Brasil abriga 11% (por ano) das vítimas de assassinatos do nosso planeta. Isso representa 40 mil pessoas por ano! Os conservadores erram é quanto à solução que eles fornecem: sempre indicam como necessário o aumento do contingente policial. Mas, aí os dados não os favorecem muito. O Brasil tem um policial para cada 304 habitantes, o que é um número igual ao das democracias ocidentais desenvolvidas, preocupadas com a segurança. Talvez esteja em questão a qualidade do policial, a concentração regional da polícia e, enfim, o que está ligado à qualidade: o treinamento e o salário (o que é parte da solução da corrupção policial).

De tudo que disse acima, nota-se que há violência e violência. A violência geral tem a ver com uma política nacional de segurança e bem-estar. Há de se pensar melhor na questão das drogas e do tráfico se quisermos de fato levar a sério a violência brasileira. Mas, quanto às violências específicas, dirigidas a grupos, elas ainda estão ligadas a elementos de ordem cultural que seguem uma lógica um pouco diferente da violência em geral. A agressão, que tem por vítima a criança, a mulher, o professor, o homossexual, o negro etc, está ligada ao que os conservadores tendem a não aceitar como sendo digno de nota. Eles se prendem a um modelo de sociedade que vê o cidadão como sendo o “eu” liberal, que se apresenta ao Estado na condição de livre, desenraizado e despersonalizado. Ele é o cidadão, apenas. Como cidadão, mostra-se segundo esse conceito que o faz computado como vítima de violência pelos gráficos da violência em geral. Mas, se apimentarmos um pouco a visão liberal (não creio que precisamos sair dela e adotar o comunitarismo para falar o que vou falar), há como vê-lo sob a violência que o coloca em um quadro que tem de tomá-lo como semilivre, situado e personalizado. Um cidadão visto dessa maneira no quadro da violência é que nos dá a relação brasileira entre violência e práticas culturais relativamente pessoais que precisam ser mudadas.

Eu explico. Quando da violência geral, aquele que a pratica não está movido diretamente pelo preconceito ou pela desvalorização real do outro. Ele está movido por um objetivo que não é o outro. O outro é meio. Ele quer a droga ou o dinheiro. Então, mata ou maltrata. Quando da violência em relação a cidadãos enraizados, semilivres e personalizados, a violência e a vítima não são meios, são fins. O que o agressor quer é realmente firmar o seu poder, a sua superioridade sobre aquele que ele toma como inferior e que, por alguma razão, ergueu o nariz contra ele ou pareceu erguê-lo contra ele. As vítimas são tomadas como aqueles que deveriam se calar, mas que não se calam, falam e falam até demais, impondo um tipo de regime não econômico de palavras que o agressor não quer ouvir, pois elas contrariam algo nele, em geral, a própria imagem do agressor em seu meio. Qual? A de que eles mandam ou deveriam mandar – em alguém, claro. Esse alguém deveria ser a potencial vítima que, então, em algum momento pior, se torna realmente a vítima. Esse desejo de subordinar alguém aliado ao preconceito contra a vítima – que faz dela alguma coisa que permite ou até pede a violência contra ela – ajudam o quadro a se configurar: o fraco se põe diante do potencial agressor, e precisa ser punido para “voltar ao seu lugar”. Feito isso, a imagem do agressor em seu meio parece restituída. Ele manda. Ele manda ao menos em alguém. Ele resolve e põe as coisas “no lugar” ao menos no seu canto – sua casa principalmente, sua rua, às vezes.

Quando ouvimos os relatos dos que presenciaram os atos dos agressores a pessoas dos grupos citados, as palavras que são contadas como saídas da boca do agressor são muito semelhantes. “Cala a boca” é uma expressão comum. “Você não vale nada” também aparece muito. “Você vai ficar no seu lugar” é outra coisa comum. Nos três casos, o agressor diz claramente que sua agressão não tem a ver com qualquer coisa que não com a própria figura do outro. Ele, o outro, está ali e, por estar ali e ser o fraco, precisa se portar como o fraco. Ele está ali como serviçal a ser chicoteado. Mas … êpa, está começando a ficar ousado, a falar o que não deve falar ou o que não deve mais falar. Não lhe foi dada voz. Como, então, que fala?

Alguns podem estranhar por eu colocar nesse meio o professor. Mas, aí também, ao menos atualmente, estamos diante de uma figura que encarnava poder até há pouco tempo, mas que agora se parece muito, em termos socioeconômicos, com o agressor. Então, por que diabos uma figura assim deveria estar na frente de uma sala dando ordens? O adolescente, criado em uma situação em que quem fala é o diferente, o realmente rico ou o realmente forte, não vai tolerar que alguém que tem apenas um saber inútil fale mais grosso. Também o professor deve calar a boca – como a criança e a mulher no lar, como a “bicha louca” na rua e como o “pretinho safado” no trabalho. Alguns dos agressores lembram os nazistas, uma vez que se dedicam a molestar pessoas com dificuldades físicas e psíquicas, o que também já se configura um grupo na mira da agressão urbana. Assim, a violência que cresce tendo como vítimas pessoas de grupos sociais determinados é um problema que os setores conservadores não querem ver. O que os setores não conservadores observam é que de fato o chamado “preconceito” fala alto. Não há como lidar com isso, como se lida com a violência em geral. Há de se lidar com isso considerando a necessidade de uma mudança de vocabulário, de redescrições dessas potenciais vítimas, para que elas saiam do lugar em que foram colocadas, como os que são um nada, ou seja, os que devem obedecer e se calar exatamente porque “foram feitos para isso”.

As políticas e leis contra a violência praticada contra crianças, mulheres, negros, homossexuais, professores, prostitutas, portadores de características físicas ou mentais diferenciadas etc forçam a sociedade a encontrar novas formas de descrição desse pessoal. Essas redescrições é que permitem que vários dos potenciais agressores não possam mais, a partir de um determinado momento, ver nas pessoas desses grupos aqueles que são indignos de abrir a boca ou falar em tom altivo. A redescrição cria novas imagens e então, de um modo às vezes até rápido, ninguém mais possui a velha imagem no horizonte, aquela que favorecia o tratamento desigual ou a atração da mão maldosa.

As leis ajudam bem na mudança de vocabulário. As mudanças de vocabulários não podem se restringir a uma ação social desprovida da colaboração da punição dada pela lei. É necessária a coerção social feita pela cultura em geral, pelo modo como conversamos, mas é necessária também a coerção dada pela punição da lei. Lei contra homofobia ou Lei Maria da Penha ou lei contra a “palmada pedagógica” ou a legislação das cotas étnico-raciais (e não “cotas para pobres”) e assim por diante ajudam os potenciais agressores no ganho de uma nova percepção, aquela que supõe que as vítimas, se são protegidas pela lei, são especiais, ou seja, são tão valorizadas pela sociedade que merecem leis próprias para cuidar delas. Isso realmente muda a face de uma sociedade. Faz ela aprender os conceitos e abandonar os preconceitos quando ela, uma vez sem escola boa, não consegue fazer isso por meios regulares. Mas, ainda com escola boa, essas leis devem existir. O fato de nossa sociedade ter optado por elas não é de agora, é uma longa história.

Redescrever é um lado da mudança social, o outro é a alteração da legislação que dá um empurrãozinho na redescrição, ensinando a todos nós, quiçá também aos conservadores, que o “somos iguais” da doutrina liberal depende, às vezes, de tratar alguns de modo desigual, favorecendo-os, exatamente para que todos voltem a ficar no mesmo patamar de igualdade. Assim, o liberalismo realmente consegue, nisso, se dizer um regime bom para se acoplar à democracia, fazendo vingar a democracia liberal.

*Paulo Ghiraldelli Jr é filósofo, escritor e professor da UFRRJ.

Fonte: http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2011/07/10/artigo-violencia-redescricao-e-democracia-liberal/