terça-feira, 15 de março de 2011

A GEOGRAFIA DAS FRONTEIRAS: da ilusão geográfica dos territórios à dicotomia corpo e espírito


por Salomão Ferreira*

É pensando nos territórios nacionais e, mais ainda, na divisão global do poder econômico entre hemisférios terrestres, que buscamos analisar as fronteiras geográficas como espaço de controle.

Para além das fronteiras físicas delimitadoras da divisão política mais geral e específica dos territórios nacionais, podemos identificar as fronteiras ideológicas que aqui chamamos de ilusão geográfica. Ela é indicadora das regiões econômicas cuja influência e poder estão diretamente ligados à capacidade produtiva mantenedora do processo de acumulação capitalista.

Essa mesma ilusão geográfica distingue as pessoas pelo que conseguem consumir: roupas, carros, perfumes, jóias, livros e entretenimento. É ela, também, que indica os padrões de beleza e renovam a estética dos objetos industriais ligando-os ao ideal do belo, do prazer e da realização pessoal dos indivíduos. Nessa linha divisória a idéia de território é plana e horizontal. Nela o sujeito está fora ou dentro desse lugar geográfico ilusório.

Dessa maneira, a periferia urbana é indicadora de fronteira econômica mais ligada à condição humana das populações e dos grupos étnicos. Isso provoca uma suposta divisão entre sujeitos, divisão essa que, por sua vez, é determinada pela cisão espírito e corpo indicativo de quem pode ou não, quem pensa ou faz, quem manda ou obedece e, mais especificamente no caso da escola, a clara cisão entre direção e professores, professores e alunos, veteranos e novatos e tantas outras possíveis. Nessa mesma direção caminham as corporações e o serviço público. É nesse último que se instalam os mais rígidos sistemas hierárquicos já conhecidos, superando, provavelmente, a hierarquia clerical.

O aparelho ideológico cuida dessa divisão para dominar e isso nos conduz a outra lógica por traz do sistema de acumulação: a apropriação da ciência como forma de conhecer as partes para melhor dominar, lógica essa herdada do princípio das táticas de guerra que procura dividir não somente o inimigo, mas também as tropas - suas especialidades e campos de domínio como o ar, a terra e o mar - para mais eficazmente dominar o inimigo. Atacar por grupos especializados conduz ao entendimento da dissecação do todo e conduz ao princípio teórico-científico do estudo das partes com vistas a conhecer e dominar o todo. A apropriação desse preceito se estende, simultaneamente, para o campo da política e da economia, sistematizando os processos de dominação do Estado nacional para além do exercício do poder central, mas difundindo-o nos meios sociais pela divisão do trabalho como delimitadores de territórios sociais excludentes. Tal delimitador consiste em fronteiras de influências que vão além do estado de direito e garantia das mesmas condições de acesso às instituições de ensino, saúde e instâncias jurídicas de direito civil e criminal.

Enfim, entendemos que essa dicotomia corpo e espírito é uma espécie de fronteira geográfica, ideologicamente reproduzida ao longo da história das sociedades ocidentais e cientificamente aperfeiçoada para garantir o exercício do poder, sem nunca abandonar o conhecimento da metodologia científica da dissecação, metodologia essa que assegura o domínio do todo pelo conhecimento e controle especializado das partes.

Referências:

ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de Estado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985
CASTELLS, Manuel. O espaço de fluxo. In: A era da informação: economia, sociedade e cultura: A sociedade em rede. São Paulo, Paz e Terra, 1999. v. 01.
SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel,1998.

* Salomão Ferreira - Estudante do 4º período da FAE (Faculdade de Educação / BH / UEMG).

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