terça-feira, 28 de setembro de 2010

ATUALIZAR A PEDAGOGIA EM RELAÇÃO AO MUNDO QUE MUDA

por Leonardfo Boff, teólogo e escritor

Séculos de lutas entre povos e conflitos de classe nos estão deixando uma amarga lição. Isso não nos fez mais humanos, nem nos aproximou e muito menos trouxe a paz. Vivemos em permanente estado de sítio e cheios de medo. Alcançamos um patamar histórico que "nos conclama a um novo começo". Isso requer uma pedagogia fundada numa nova consciência dos problemas econômicos, sociais, culturais e espirituais.

Essa consciência está nos mostrando um caminho: entender que todas as coisas são interdependentes e que mesmo as oposições não estão fora de um todo dinâmico e aberto. Por isso, não cabe separar, mas compor e incluir, reconhecer as diferenças, mas também buscar as convergências e, no lugar do ganha-perde, buscar o ganha-ganha. Tal perspectiva holística vem influenciando os processos educativos. Temos um mestre, Paulo Freire, que nos ensinou a dialética da inclusão e a colocar o "e" onde antes púnhamos o "ou". Frei Clodovis Boff entregou-nos um livrinho que se tornou um clássico: "Como Trabalhar com o Povo". E agora, face aos novos desafios do mundo, elaborou um decálogo daquilo que poderia ser uma pedagogia renovada.

1. Sim ao processo de consci-entização, à consciência crítica e à razão analítica (cabeça). Mas sim também à razão sensível (coração), onde se enraízam os valores e de onde se alimentam o imaginário e as utopias.

2. Sim ao "sujeito coletivo" ou social, ao "nós" criador de história ("ninguém liberta ninguém, nos libertamos juntos"). Mas também sim à subjetividade de cada um, ao "eu biográfico", ao "sujeito individual" com suas referências e sonhos.

3. Sim à "práxis política", transformadora das estruturas e geradora de novas relações sociais, de um novo "sistema". Mas sim também à "prática cultural" (simbólica, artística e religiosa), "transfiguradora" do mundo e criadora de novos sentidos.

4. Sim à ação "macro" ou societária (à "ação revolucionária"), aquela que age sobre as estruturas. Mas sim também à ação "micro", local e comunitária como base do processo estrutural.

5. Sim à articulação das forças sociais sob a forma de "estruturas unificadoras" e centralizadas. Mas sim também à articulação em "rede", na qual, por uma ação descentralizada, cada nó se torna centro de criação, de iniciativas e de intervenções.

6. Sim à "crítica" dos mecanismos de opressão, à denúncia das injustiças e ao "trabalho do negativo". Mas sim também às propostas "alternativas", às ações positivas que instauram o "novo" e anunciam um futuro diferente.

7. Sim ao "projeto histórico", ao "programa político" para uma "nova sociedade". Mas sim também às "utopias", aos sonhos, à busca de uma vida diferente, enfim, de "um mundo novo".

8. Sim à "luta", ao trabalho, ao esforço para progredir, à seriedade do engajamento. Mas sim também à "gratuidade" como se manifesta no jogo, no tempo livre, na alegria de viver.

9. Sim ao ideal de ser "cidadão", "militante" e "lutador", sim a quem se entrega, cheio de entusiasmo e coragem, à causa da humanização do mundo. Mas também sim à figura do "animador", do "companheiro", do "amigo", em palavras pobres, a quem é rico de humanidade, liberdade e amor.

10. Sim a uma concepção "analítica" e científica da sociedade e suas estruturas. Mas sim também à visão "sistêmica" e "holística" da realidade, vista como totalidade, integrada dialeticamente em suas várias dimensões: pessoal, de gênero, social, ecológica, planetária, cósmica e transcendente.

Fonte: http://www.otempo.com.br/otempo/colunas/?IdColunaEdicao=12954

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